sexta-feira, 29 de junho de 2007

O Casamento: A Cena da STV

A STV publicou ontem uma reportagem sobre um casamento abortado no palácio da família, pela acção da família da mulher com quem o nubente do dia (que pretendia casar com outra mulher) vivia em união de facto há mais de 10 anos. Dessa relação nasceram 3 filhos.
Infelizmente, como habitualmente na STV, da reportagem só conhecemos a “versão” de uma das partes sendo essa que nos é dada a consumir e, a partir da qual, a imagem do jovem Alberto (o nubente) é publicamente escangalhada.


Mas analisemos o que nos é dado a conhecer:

A Lei define União de Facto como ligação singular existente entre um homem e uma mulher, com carácter estável e duradouro, que sendo legalmente aptos para contrair casamento não o tenham feito, pressupondo comunhão plena de vida pelo período superior a um ano sem interrupção.

A situação descrita na reportagem (vida em comum por 12 anos) enquadra-se nesta definição constante do artigo 202 da Lei 10/2004, de 25 de Agosto, Lei de Família.

Que efeitos é que a Lei atribui às uniões de facto?

A união de facto, nos termos do nº 1 do artigo 203 da Lei de Família, releva para a presunção de maternidade e paternidade, no sentido de que os filhos nascidos na sua constância presumem-se filhos do casal e, para efeitos patrimoniais (nos termos do nº 2 do mesmo artigo), à união de facto aplica-se o regime da comunhão de adquiridos.

Portanto a união de facto tem como efeito: a presunção de maternidade e paternidade e a equiparação, em termos patrimoniais, ao casamento realizado em regime da comunhão de adquiridos.

Esta é uma inovação da nova lei de família, que visa salvaguardar a situação em que se encontram muitos dos moçambicanos que, sendo legalmente aptos para contrair casamento, não o fazem (nos termos e nas formas descritas na lei) por diversos motivos que não cabem aqui.

A lei dá três opções de casamento: civil, religioso ou tradicional, sendo que ao casamento monogâmico, religioso ou tradicional é reconhecido valor e eficácia igual à do casamento civil quando tenham sido observados os requisitos que a lei estabelece para o casamento civil conforme dispõe o artigo 16 da Lei de Família.

Quais são os impedimentos para o casamento?

Temos os dirimentes absolutos que obstam o casamento da pessoa a quem respeitam:
a idade inferior a 18 anos
a demência notória, mesmo nos intervalos lúcidos, e a interdição ou inabilitação por anomalia psíquica
o casamento anterior não dissolvido religioso, tradicional ou civil, desde que se encontre convenientemente registado por inscrição ou transcrição conforme o caso.

Existem outros impedimentos dirimentes relativos e impedimentos impedientes que não cabem nesta análise.

Haveria algo que legalmente impedisse aquele casamento.

Nada. Mesmo se tivesse havido lobolo e sendo este considerado casamento tradicional, não estando convenientemente registado conforme manda a lei aquele homem poderia, nos termos da lei, casar.

Na falta de condenação jurídica o que é que nos resta?

A condenação da conduta moral daquele indivíduo, provando-se que, de facto, viveu maritalmente com aquela senhora até ao dia em que saiu para casar.

Deveria a Lei proteger a mulher perante estas situações?

A lei deve proteger a todos: homem e mulher destas situações. O acto que a STV nos deu a conhecer (nos moldes em que deu) não é exclusivo dos homens. Pode igualmente ser praticado por mulheres embora, frequentemente o seja por homens.

O que devemos indagar neste momento é: qual é o nosso papel como sociedade? Como devemos agir para evitar a banalização da instituição que é o casamento? O que é que está a falhar na nossa sociedade? Qual deve ser o nosso comportamento nas nossas relações?

Aproveito para deixar a dica de que é de lei que “a ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas”.

Tentemos conhecer e perceber a Lei. Agora temos o Pandora Box e o Atneia que nos ajudam a ter as leis perto de nós.