segunda-feira, 18 de fevereiro de 2008

Cidadania - Um debate que se requer

Os debates que correm na blogosfera e, sobretudo, os acontecimentos do dia 5 de Fevereiro, trouxeram (como nunca) uma maior abordagem sobre cidadania. Muitos se têm referido a necessidade de, em Moçambique, despertarmos para o exercício de uma “Cidadania consciente” que, quanto a mim, passa fundamentalmente pelo conhecimento dos nossos direitos que servirão de guias no seu exercício e na participação política que devemos ter. Mas afinal, o que é cidadania?

“A cidadania expressa um conjunto de direitos que dão à pessoa a possibilidade de participar activamente da vida e do governo de seu povo. Quem não tem cidadania está marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa posição de inferioridade dentro do grupo social” (DALLARI, Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo: Moderna, 1998. p.14).

Um dos direitos que a Constituição da República de Moçambique nos confere é o da manifestação nos termos da lei, conforme dispõe o artigo 51. Parece consensual a condenação da violência cometida pelos manifestantes do 5 de Fevereiro. Tirando a violência encontraríamos certamente o exercício da tal cidadania através das manifestações contra a subida do chapa, num exercício similar ao que é feito em várias partes do mundo.

No contexto moçambicano, e não só, parece me que reduzimos a cidadania à votação e ao pagamento de impostos. E depois disso? Não haverá mais nada que o CIDADÃO deva fazer? Serão a votação e o pagamento de impostos as únicas formas que nós, cidadãos moçambicanos, temos de participar activamente da vida e do governo do nosso povo?

A herança colonial e a visão revolucionária dos primeiros anos de independência podem constituir barreiras culturais e históricas para o sentido de cidadania que devemos ter no contexto de uma democracia como a que pretendemos construir. Um dos reflexos dessa barreira é o nosso distanciamento em relação a coisa pública ou o alheamento quase completo em relação às políticas que, em nosso nome, os sucessivos governos da República de Moçambique tem adoptado.

Como diz Elísio Macamo “o governo tem, em princípio, um mandato da sociedade para fazer coisas em nome dessa sociedade.” Em minha opinião, e em face desta premissa, o que a sociedade deve fazer permanentemente, é fiscalizar como, em cada momento, o governo cumpre esse seu desígnio. Os direitos que temos como cidadãos não são privilégios e exigi-los não é ser mal criado e inoportuno. A cidadania é, portanto, o conjunto dos direitos políticos de que goza um indivíduo e que lhe permitem intervir na direcção dos negócios públicos do Estado.

Podemos muitas vezes compreender os direitos como uma concessão, um favor de quem está em cima para os que estão em baixo. Contudo, a cidadania não nos é dada, ela é construída e conquistada a partir da nossa capacidade de organização, participação e intervenção social.

A cidadania não surge do nada; nem a consagração legal de certos direitos deve ser tida como a realização desses direitos. É necessário que o cidadão participe, seja activo, faça valer os seus direitos. Construir cidadania é também construir novas relações e consciências. A cidadania é algo que se aprende não só com os livros, mas, também, com a convivência, na vida social e pública.

Ser cidadão é respeitar e participar das decisões da sociedade para melhorar suas vidas e a de outras pessoas. A educação é fundamental para a construção do ideal de cidadania e para o despertar de consciências sobre a coisa pública. É imperioso despertar a cidadania divulgando-a através de instituições de ensino e meios de comunicação para o bem-estar e desenvolvimento da nação.

Será exercitar a nossa cidadania assumir que somos parte do problema e que algumas soluções que esperamos sempre dos outros (normalmente o Governo, os Municípios ou outros entes públicos) podem brotar de nós. Assumirmos isso far-nos-á compreender que o desejo de vivermos, por exemplo, numa cidade limpa passa por não jogarmos papeis, cascas de banana, latas ou garrafas de cerveja no chão e em qualquer sítio, despertará a necessidade de gerirmos o lixo produzimos, inibir-nos-á de vandalizar infra-estruturas públicas como telefones, bocas-de-incêndio nos nossos prédios etc.

Será igualmente exercitar a nossa cidadania quando, fazendo as coisas correctamente, conscientemente interpelarmos o Estado no sentido deste cumprir com a sua parte fornecendo mais e melhores serviços públicos. Nestes termos, é exercitar a cidadania interpelar o município no sentido de compreender, para além da parte que nos toca (o tal deitar lixo no chão de que falava), porquê é que a cidade não anda quando milhões de munícipes pagam a taxa de lixo em cada factura de energia. É exercitar a cidadania exigir um melhor serviço de radiodifusão tendo em conta as taxas que pagamos.