segunda-feira, 20 de dezembro de 2010

Ao Elísio Macamo, nas Vésperas do Seu Aniversário

Mano, não havia outro mês para nasceres? Tinha mesmo que ser Dezembro? As plataformas digitais em que andamos conectados me anunciam o seu aniversário para breve e, mesmo para fechar o ano (e fecharei com esta carta), te escrevo esta carta para te dizer parabéns e dar te notícias de Moçambique.
Sim, de Moçambique. Este país é relevante tão relevante que não escapou à investida wikilikiana com textos do famoso Todd, o Chapman.
Mais interessante do que as revelações a roçarem a irresponsabilidade daquele diplomata, foi a revelação (para mim) de que, no nosso jornalismo ainda ha intervalos de lucidez e há ainda jornalistas que buscam a essência das coisas, mesmo entre os chamados independentes cuja vocacao, muitas vezes, parece ser partir tudo o que tenha a ver com determinadas figuras e/ou partidos. Enquanto uns faziam eco de Chissano e Guebuza como “cúmplices” do narcotráfico, o Jornal Savana por exemplo sugeria “uma leitura desapaixonada dos Wikileaks” ajuntando que “alguma informação constitui uma aberração, e deve imediatamente ser rejeitada”, que as “mensagens estão recheadas de nuances, mas nunca chegam a acusar quer o actual quer o anterior Presidente da República de envolvimento no narcotráfico, como certas correntes têm tentado fazer crer” e que “com todas as suas imperfeições e erros de facto, os conteúdos das mensagens de Todd Chapman merecem ser analisados com alguma seriedade no que diz respeito à essência do que elas pretendem transmitir; que é o perigo de Moçambique se tornar num país de economia narcótica, onde a posição da nossa moeda nacional face às outras moedas de referência internacional depende significativamente das flutuações no fluxo de cash proveniente do negócio de substâncias proibidas, pondo em causa a sanidade da nossa própria economia.” Interessante ponto de vista este expresso no editorial do Savana não é mano? Não me enganei. Vem no Savana.

Este é o Wikileaks versão moçambicana. Como alguém afirmou noutro lado, é possível que após este escândalo haja uma nova forma saudável de fazer diplomacia. A ver vamos. Ainda ouvirei a sua opinião.

Estive no Xai-Xai dos nossos sonhos. Quando cá vieres melhor me levar como guia (ai cumprimos a promessa das duas cervejas que já dura um ano ou mais). Temo que não reconheças a cidade. De uma cidade dominada por cantinas quase centenárias e cujo laivo de modernidade no que ao comercio diz respeito emergia das lojas de conveniência das bombas ali instaladas, o cenário começa a mudar. Chegaram as grandes lojas de mobiliário, uma grande cadeia de supermercados instalou-se no Xai-Xai e na Macia, uma mundial marca de Fast Food (essencialmente frango) está em vias de se instalar onde alguns chineses e gentes de outras origens (nacionais e estrangeiras) lutam por dar uma imagem airosa da nossa cidade. Fiquei maravilhado.

O cenário de poucas alternativas no que ao alojamento diz respeito parece caminhar para o fim. Uma placa informou-me que um grupo vai reabilitar e operar o Hotel Xai-Xai. Não é interessante mano?

A imagem de uma cidade com pouquíssima oferta de serviços, quase atrasada tende a sumir. O tédio das diferenças com um Maputo que dista APENAS 200KM esfuma-se perante interessante oferta de serviços, espaços etc que implicam emprego para nossos irmãos e renda para as suas famílias. Pode ser que alguém não ache, mas h’a mudanças; há desenvolvimento. Traga uma legião de colegas daqui há um tempo que eles ficarão bem.

O Amosse Macamo meu amigo e colega de trabalho e de algumas outras batalhas falou dos “Embaixadores da Desgraça” antes, havia levado emprestado algumas das perguntas que orientam esse texto num post publicado aqui. Nessa época comentaste que “o único que se devia esperar de todos nós é falar com responsabilidade dentro e fora do país. falar com responsabilidade não é dizer o que não prejudica o país (porque isso seria difícil de determinar), mas sim o que é passível de ser discutido de forma construtiva na esfera pública. Infelizmente, é justamente isto que tem feito mais falta em muitos debates. por exemplo, achei que Jorge Rebelo tem sido menos responsável na suas intervenções por fazer afirmações que não conduzem ao debate de ideias. a sua sugestão de que os íntegros estão a ser corridos do governo parece-me bastante gratuita sob este ponto de vista. pelo contrário, acho as intervenções de Castel-branco muito responsáveis porque permitem uma discussão construtiva (independentemente de ele ter razão ou não). A coisa piora quando nós os demais reduzimos tudo ao "estar contra ou a favor" e preocupamo-nos pouco com a substância do que as pessoas dizem. Há muitos que pensam que participar na discussão pública é formar clubes de apoio a este ou aquele. O patriotismo não pode ser uma medida útil. O sentido crítico é que deve ser o nosso guia.” Não tenho dúvida que na diáspora onde estas usas o teu sentido crítico e com a sua cultura de trabalho etc, como diz o PR AEG, complementas a diplomacia deste país, sem ser nenhum wikileakiano e ajudas no bom caminho rumo a prosperidade como o exmo Sr. Presidente classificou o pais no seu informe ao parlamento.

Feliz aniversario Poiombo. Que Deus te dê longa vida e que curtas as festas da melhor forma possível.

Mutisse.

PS: Bem haja um jornalismo responsável. Felicitações à negação do escangalhar da imagem das pessoas com base em informações levianas. Parabéns ao Savana e a todos os jornais que trataram responsavelmente este assunto.

PS2: O espaço que damos a divulgar banditices cria os seus heróis. É difícil de negar que hajam estes fenómenos que Mapengo aborda aqui.

segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

O Fim dos Tabus?

Contava que o post anterior fosse o último de 2010. Não será. Eis me aqui a fazer o meu exorcismo neste espaço.

Exorcismo? Sim. Tive uma semana atribulada. Perdi uma sobrinha muito querida. Tatiana Margarida Filipe Mutisse (30/03/2004 – 08/12/2010) deixou de fazer parte do mundo dos vivos vítima de um cancro pulmonar com que vinha lutando desde Novembro de 2009. A menina foi para um lado de onde não mais será actriz presencial do teatro e das atribulações da vida. Lá de onde vivem os anjos (que é o que ela se deve ter transformado) observará tudo de forma muito privilegiada. Em paz que é o que ela merece.

Exorcismo? Sim. Exorciso as dúvidas. Mando as embora e me entretenho a “sugar” a informação que vou consumindo. É vantajoso ser “mais clarinho” em Moçambique? Essa “vantagem comparativa” localiza-se em determinados segmentos de actividade ou em todos? Quem cria essas vantagens? Quem se beneficia delas?

Todo este exorcismo surge em consequência de uma resposta feliz de Sol de Carvalho em entrevista ao Jornal “o País” edição de Fim de Semana 11 de Dezembro 2010. Feliz porque Sol de Carvalho poderia ter sido MAIS politicamente correcto e fugir da tentação de falar de “brancos e pretos” nas respostas que deu a Policarpo Mapengo. Podia ter fugido e não dizer (em resposta a uma pergunta sobre a existência ou não de racismo no cinema) por exemplo que “não acho. O que acontece é que, simplesmente, por razões históricas as pessoas que ficaram, os cineastas e os profissionais do cinema, a maior parte delas são mais claras. São as pessoas mais claras que se impuseram.” Esta resposta segue uma outra em que Sol fala do mercado para novos profissionais, da experiência e refere que “depois seguem-se esses problemas de brancos e pretos… isso é outra conversa”.

Disse que o Sol foi FELIZ na resposta que deu. Foi sincero. A visão do Sol é generalizável? De que forma podemos pegar nestas coisas que muitos têm medo de abordar e discutir a nossa moçambicanidade, na nossa diversidade? De que forma podemos, todos nós, brancos e negros, falar de nós e nos sentirmos autenticamente moçambicanos sem determinados estigmas que nos apoquentam? Será possível abandonar as “razões históricas” que ditaram a criação de determinadas elites profissionais (no jornalismo – principalmente nos primeiros anos de independência de onde despontaram os Mias, Cardosos, Machado da Graça e outros – no Cinema, na literatura) e não reivendicar os “privilégios” inerentes num mundo competitivo como o de hoje?

Creio que sim.

quarta-feira, 8 de dezembro de 2010

2010: Findando Com Mostras de Vitalidade e Seriedade.

2010 está prestes a findar. Entre bypasses polémicos, denúncias de corrupção no nosso futebol que ensombram a família do futebol no geral e uma família específica em particular (presente no dirigismo federativo, no dirigismo de um clube e no agenciamento de jogadores que tem tido menção honrosa nos jornais – e não só – por diversos motivos), julgamentos de casos de descaminho de fundos públicos, prisão de nacionais no estrangeiro transportando elevadas somas, anúncio da chegada dos 7 milhões aos (alguns) municípios, lá temos que olhar para trás e fazer a retrospectiva dos 12 meses que findam.

Há coisas boas que aconteceram e/ou estão em curso neste ano.

A primeira: RESPONSABILIZAÇÃO. Este blog tem muitas referências a necessidade de responsabilização perante actos ilícitos. O fortalecimento das instituições estatais e o cometimento do próprio Estado com o rigor na gestão da coisa pública, começa a mostrar-se com os julgamentos que se sucedem: depois do caso AdM vieram outros: Financas de Maputo, CPD e agora o caso MINT em julgamento e cujos implicados me merecem respeito porque inocentes até transito em julgado de sentença condenatória se houver.

Entre discursos redutores deste “movimento” responsabilizador (incluindo daqueles segmentos que vêm politiquices em tudo) não posso, neste 2010 a virar a esquina, deixar de congratular os profissionais da área da Administração da Justiça que de tudo fazem, para do lado que lhes cabe, manterem o Estado de pé. Bem hajam. Aos procuradores, juízes e outros profissionais (muitos dos quais compartilhamos os bancos da faculdade) o meu BAYETE.

Pobreza Urbana – é verdade que mais de metade da população moçambicana vive nas zonas rurais. Não discordo de quem tomou aqueles pontos como prioritários e, em mais de cinco anos, drenou lá milhões de meticais que tem ajudado a mudar a vida de muitos moçambicanos.

Porque a minoria urbana ou urbanizada que também sofre da pobreza havia que dar a estes condições de a combater. Os 7 milhões chegam as cidades. Cabe aos Municípios pioneiros nesta iniciativa, capitalizar esta iniciativa definindo estratégias próprias adequadas a situação concreta de cada município e que enfrentem o problema “de frente” rumo ao sucesso. Sei que o meu já está a fazer. Não haverão, em minha opinião, soluções pré concebidas válidas para todos, em todo o lado, de igual modo. Há situações próprias de cada local que tem que ser potenciadas. Avante. Aos presidentes dos municípios escolhidos o meu voto de confiança de que quem acredita que sairão soluções que reduzam a pobreza de mais moçambicanos.

As instituições funcionam. Há liberdade de expressão. Embora timidamente, começamos a abandonar a prática de discutir pessoas. Discutimos ideias. Cresce o movimento dos que procuram conhecer BEM os problemas para propor boas soluções num país cheio de soluções (rsss – como diz Elísio Macamo).

O meu Maxaquene superou-se este ano. É vice campeão em futebol, venceu a taça é campeão em Básquete. O Desportivo em femininos honrou o país no africano de clubes.

Coisas más… corrupção no futebol. Fala-se de corrupção em outros sectores. Um mal a combater.

Continuamos arregimentados. Parece que há os eternos “do contra” e os eternos “prós”. Muitas vezes emerge um debate de surdos em que não se busca a validade do argumento do outro. Busca-se o facto de ser do contra. Ultrapassemos. Que as minhas ideias sejam válidas por si e não em função do meu alinhamento seja de que natureza for.

Um abraço a todos e, antecipadamente, votos de feliz 2011.

Mutisse.



PS1: Que “O país” edição fim de semana cresça em 2011 e que seu editor e outros superiores hierárquicos no grupo não durma na sombra da qualidade que se reconhece ao produto.


PS2: Que Egídio Vaz e Noa Inácio voltem ao debate activo de ideias nos seus blogs e outros quadrantes.


PS3: Que o país progrida em 2011 e se afirme cada vez mais como incomodado com a ajuda externa e dê passos para se livrar dela.


PS4: Que eu ganhe o meu PRIMEIRO milhão de dólares.

domingo, 21 de novembro de 2010

Um Texto Contraditório e de Negação do Passado

Martin de Sousa colocou no seu blog Soldado Raso um texto interessante de Lopes Muapenta que vai na esteira do que temos discutido aqui, aqui ou mesmo aqui e na esteira do que disse num comentário no post anterior. Creio que podemos discuti-lo aqui ou lá no blog do Martin. O texto foi publicado no Jornal “Domingo” de ontem 21 de Novembro de 2010 com o título: Sérgio Vieira: Um Texto Contraditório e de Negação do Passado

segunda-feira, 15 de novembro de 2010

Os Embaixadores da Desgraça

As perguntas emprestadas do Amosse Macamo que coloquei no último post sobre os críticos, levantaram aqui e noutras plataformas um debate interessante a partir do qual o meu amigo desenvolveu e concluiu o raciocínio que apresento abaixo.

Os Embaixadores da Desgraça
Amosse Macamo



Enquanto cidadãos, sempre que colocados fora dos limites geográficos do nosso pais, tornamo-nos voluntária ou involuntariamente embaixadores do nosso país. Aliás, ser embaixador do nosso país quando no estrangeiro deveria ser um acto consciente de cidadãos responsáveis e comprometidos com o seu país.

A ideia da aldeia global rompeu com as fronteiras e aquilo que ontem era exclusivo das elites políticas e/ou de uma minoria com posses, está quase que ao alcance de todos, refiro-me por exemplo as viagens para o exterior. Hoje há um crescente número de pessoas que viajam para os diferentes cantos do mundo, ora estudando, ora trabalhando, ora em passeios e sem descurar as viagens virtuais, onde sentados num pequeno ecrã mágico podemos estar e em tempo real em conexão com pessoas de diferentes partes do mundo. Ora, ao entrarmos nestas viagens, nestes contactos, acabamos transportando voluntária ou involuntariamente, a imagem do nosso pais, ao que, uma pergunta urge fazer:


Como um moçambicano deve tratar assuntos sensíveis do seu país fora deste? E mais, como transmitir alguns factos (negativos) que internamente sabemos que são reais a quem é determinante para nós? (refiro-me a título de exemplo à informação que um moçambicano possa dar a um ente que contribui para o orçamento do nosso Estado).


Hoje, e a mercê das aberturas que acima anunciava, emerge uma nova classe intelectual moçambicana que viaja para fora e, se não viaja, consegue ter contactos com o exterior, com pessoas que querem saber mais sobre o nosso país. Alguns integrantes desta nova classe tem sido seleccionada dentre aqueles que não simpatizam com o governo de dia, sendo que são os mesmos que servem de fonte primária àqueles que de uma ou doutra forma, pretendem saber de nós.


São os que confirmam os dados contidos em estudos de campo feitos entre quatro paredes, são estes que quando razões internas de algumas nações obrigam que se achem culpados sobre qualquer assunto ajudam a encontrar, são estes que usando seus próprios e limitados critérios analíticos indicam os corruptos, os barões de drogas, os maus governantes, são, na verdade o olho pouco vigilante e o ouvido do outro, são, o que chamo de Embaixadores da Desgraça; pessoas a quem interessa somente mostrar a imagem negra do nosso pais lá fora.

Não me oponho que a informação saia para fora, aliás, com as tecnologias de informação pensarmos que podemos esconder alguma informação ou impedir algumas pessoas de reportar seja lá o que for não passa de um exercício inútil, contudo, ao sairmos lá fora, devemos informar e como bem dizia um amigo de ideias, com responsabilidade. Mas talvez seja importante recuperar a resposta deste meu amigo, quando coloquei a mesma pergunta de partida deste texto no meu mural do facebook.


Dizia o meu amigo e passo a transcrever: “Isso depende da consciência cidadã de cada um. O recomendável seria colocar os desafios alcançáveis em vez de expor os problemas, muitas vezes ideológicos.” E acrescenta este meu amigo, mesmo para explicar o porquê de informar com responsabilidade e o risco que incorremos ao relatar somente os problemas: “Porque, podemos pensar que ao falarmos tudo de mal aos brancos estamos a nos distanciar do comportamento dos nossos líderes. Porém, o reverso da moeda é que você passa a não ter palavra em tudo que acaba de dizer”- fim da citação.


O meu amigo tinha resumido o espírito da pergunta de retórica que fizera, é que, é incrível como as pessoas pensam que ficam mais confiáveis lá fora quando apontam somente os erros. Se ainda vivêssemos no tempo em que a liberdade de expressão era coarctada, diria que tal procedimento serve de protesto, mas muitas vezes, trata-se de pessoas que internamente conhecem e dominam os mecanismos pelos quais podem expor os seus problemas e não o fazem, a espera de uma oportunidade para serem chamados por uma ONG e/ou organizações político económicas, para falarem das suas frustrações como se de verdades se tratassem. E, mesmo que considerando que falam verdade, quando falta o elemento responsabilidade na sua locução, acabam fazendo o papel inverso do que se pretende.


Olhando para esta questão do ponto de vista da nossa sociedade, diríamos que não há famílias que não tem problemas, contudo, é preciso saber lidar com os problemas de forma responsável, porque, ao membro da família que for questionado fora como vai a sua família e desatar a falar mal da sua própria família, não sabemos se este merece ou não consideração como membro da família. Aliás, no âmbito da responsabilidade aludida, mais do que conhecer e enumerar todos os problemas do país, torna-se essencial avançar propostas de soluções ou, não as tendo, ao menos, enunciar as soluções que outros experimentam para os problemas identificados.


Ao acaso, alguma vez esses Embaixadores da Desgraça já ouviram as pessoas a quem eles dão relatórios de mal dizer, a falar mal das suas próprias nações? Certamente que não, aliás, o norte-americano combate internamente de forma obstinada a pena de morte, e nem por isso, o autoriza a falar dela com a mesma liberdade com que fala internamente no seu país. Aliás, sempre que é questionado fora, corre logo para os aspectos que considera humanitários na pena, como a questão conceder uma última missa e refeição a quem será executado, fala do aspecto “humanizante” da injecção letal, dando a ideia de que aquela torna a morte menos dolorosa, como se quem morre pudesse acordar para confirmar a informação.


São os Embaixadores da Desgraça que não hesitam em convidar aos países que nos apoiam a cortarem a ajuda porque segundo eles em Moçambique há corruptos. São estes, que não medem (e nem sentem necessidade de o fazer) esforços ao pedir ao outro cortes que se sabe castigam o moçambicano comum só para serem vistos como diferentes, pensantes, iluminados, os únicos que detectam e denunciam erros de governação, a quem se deve ouvir porque tradutores da verdade.


O que sucede muitas vezes, é que quem nos ajuda já tem referências destes males como a corrupção em relatórios e ou estudos encomendados e não poucas vezes conduzidos com ligeireza, ao que, quando a aqueles se acresce uma voz de um nacional desse mesmo pais, e sendo alguém que se presume diligente, os rumores passam a constituir verdades e pior quando a tonalidade da pele de quem diz se aproxima mais e/ou se iguala ao do ocidental.


O que não desconfiam é que a informação que aquele traz muitas vezes é suportada por uma carga ideológica, que pode reflectir frustrações e até ignorância sobre o assunto que se pensa conhecer, mas, porque é nacional, e até formado na área em causa, não há outra presunção senão a de que fala a verdade mesmo quando em prejuízo de todos nós como costuma ser.


São estes Embaixadores da Desgraça que correm para as redes sociais e outros espaços divulgando excertos mesmo antes da divulgação formal os dados de um certo relatório, como se tivessem acesso as fontes, quando no fundo as fontes são eles mesmos porque impacientes em verem retornar os relatórios que eles mesmo enviaram e divulgam.


O meu apelo aos Embaixadores da Desgraça, se é que vale a pena apelar, é o de que podem sim mandar a informação, mas que olhem para esta com alguma responsabilidade porque atitudes como esta enfraquecem os Estados e consequentemente a sua própria liberdade no lugar de os fortificar, que saibam que na resposta as ambições particulares, pode-se comprometer o projecto de um povo, sim, uma nação vale antes pelo seu povo e não pelos governantes e devia ser sob prisma do povo que se deveria repensar as sugestões ao ocidente de cortar e/ou diminuir a ajuda por exemplo, ou outras formas de intromissão degradantes e humilhantes para o nosso Estado. A continuarem no caminho em que seguem saibam que um dia nem um, nem outro, vos vai querer ouvir, porque, acreditem, que quem vos pede informações sensíveis sobre o vosso país e vocês dão sem contemplações, sabe de antemão que vocês não são confiáveis, pelo que vos usarão até o dia em que não forem mais úteis.


Mas seria injusto terminar este artigo sem congratular-me, por todos aqueles moçambicanos que mesmo reconhecendo os problemas que enfrentamos no dia-a-dia, projectam o nosso pais com uma mensagem de esperança, de confiança, responsabilidade, estabilidade social, e que olham para os problemas como desafios. Para este, um abraço de quem sabe que temos problemas, mas que podem ser solucionados e ainda o meu abraço, a quem se bate e discute todos os dias os problemas reais deste pais com frontalidade, sem apelo a emoções, pessoas que lhes interessa somente um Moçambique próspero.


Amosse Macamo



PS1: Deixem me acrescentar aqui um comentário de outro Macamo em relação as questões que este Macamo, o Amosse, coloca aqui:

Caro Júlio e demais comentadores, concordo com as intervenções do Nelson e do Reflectindo. O único que se devia esperar de todos nós é falar com responsabilidade dentro e fora do país. Falar com responsabilidade não é dizer o que não prejudica o país (porque isso seria difícil de determinar), mas sim o que é passível de ser discutido de forma construtiva na esfera pública. Infelizmente, é justamente isto que tem feito mais falta em muitos debates. Por exemplo, achei que Jorge Rebelo tem sido menos responsável na suas intervenções por fazer afirmações que não conduzem ao debate de ideias. A sua sugestão de que os íntegros estão a ser corridos do governo parece-me bastante gratuita sob este ponto de vista. Pelo contrário, acho as intervenções de Castel-Branco muito responsáveis porque permitem uma discussão construtiva (independentemente de ele ter razão ou não). A coisa piora quando nós os demais reduzimos tudo ao "estar contra ou a favor" e preocupamo-nos pouco com a substância do que as pessoas dizem. Há muitos que pensam que participar na discussão pública é formar clubes de apoio a este ou aquele. O patriotismo não pode ser uma medida útil. O sentido crítico é que deve ser o nosso guia, algo que tu Júlio tens praticado bastante neste blogue. abraços.

Elísio Macamo

PS2 Chamo atencao aos textos publicados aqui, aqui e aqui por Abdul Karim que mos remeteu tambem por email. Agradeco eh uma visao interessante que tem a ver com o que discutimos aqui.

Há “Bifes” no Futebol em Moçambique

O meu clube do coração é Vice Campeão nacional de Futebol; Vencedor da Taça de Moçambique em Futebol; Campeão Nacional de Basquetebol Sénior Masculino; Também é campeão da Cidade de Maputo nas camadas de formação (juvenis e juniores) em futebol. Grande obra do meu Maxaquene.

Se por um lado faço um balanço positivo da época, como adepto ferrenho não posso deixar de mostrar a minha indignação com as notícias de viciação de resultados no Moçambola, que encheram as páginas dos nossos jornais quase todas as semanas no decurso da prova.

Mais estupefacto fico quando leio estas notícias saídas no Jornal o País de hoje dia 15 de Novembro de 2010, em que Arnaldo Salvado, treinador do meu clube, denuncia actos de corrupção praticados por alguns dirigentes, chamando os bois pelos nomes.

O que vem a ser isto? Que medidas está a Liga moçambicana de Futebol e a própria federação a tomar para clarificar estas questões pouco abonatórias do nosso desporto e do nosso futebol em particular? Que rumos devemos tomar? Qual é o papel dos intervenientes no processo desportivo na credibilização do nosso desporto?

quarta-feira, 10 de novembro de 2010

Ainda Sobre os Criticos: Ha Corruptos? Cortem Ajuda

Na entrada anterior debatemos exaustivamente questões ligadas ao nosso passado e ao nosso presente e, fundamentalmente, a forma contextualizada como devemos olhar para esse passado e o presente. Um debate interessante que se estende agora para este espaço do Agry White.

Tenho é a impressão de que algo ficou por dizer. Há corruptos no Governo como diz o camarada Jorge Rebelo. Para piorar, os honestos estão a ser corridos do poder (casos dos Dr.s Comiche e Garrido) em benefício dos corruptos.

Assim sendo, devíamos pedir o corte da ajuda externa. Ou não? A “greve” dos nossos brothers, a semelhança do ocorrido nos primeiros tempos do presente mandato, devia ser induzida por nós através destas constatações. Justo não é?



Estaríamos a prestar um serviço honroso a nação. Ou não?

Aproveitando e pedindo emprestado um questionamento do meu amigo Amosse no seu Facebook acrescento mais questionamentos: Como um Moçambicano deve tratar assuntos sensíveis do seu País, principalmente, quando está fora? Como transmitir alguns factos (negativos) que internamente sabemos que são reais (ou mesmo os que os sabemos irreais ou duvidosos) a quem é determinante para nós? (falo por exemplo da informação que possa ser prestado a países que ajudam no nosso orçamento).

segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Que Dizer de Nós? Ontem e Hoje...

Os últimos pronunciamentos de grandes figuras do Partido Frelimo levantam a mim questões relevantes que devem merecer uma aabordagem crítica desapaixonada.

O nosso camarada Jorge Rebelo veio a público e "partiu a loiça" como se diz por aí, com críticas das quais nem AEG, ele próprio, escapou (afinal o "não corrupto" Dr. Ivo Garrido foi "corrido" por Guebas).

Estes pronunciamentos tiveram eco em determinada imprensa que não se coibiu de colorir as primeiras páginas com título parangonosos de aplauso a "rebeldia" interna deste destacado militante da Frelimo.

Se por um lado aplaudo o exercício democrático de, livremente, expressarmos as nossas opiniões, custa-me um pouco olhar para as comparações, reais ou aparentes, com o passado.

A abertura que se experimentou teve muitas vantagens económicas e sociais. Desde logo, a circulação mais livre de pessoas, maior oferta de bens e serviços no mercado, maior crescimento económico, maior abertura no debate de ideias, etc.
Nestes termos me parece falta de honestidade intelectual e política quando se comparam os níveis de criminalidade e de corrupção entre tempos do socialismo e os tempos actuais.
Nos tempos do socialismo todos vivíamos mal, com as bichas, com as carências de todo o tipo. A sociedade era fechada, com a actuação omnipresente dos Chefes de Quarteirão, dos milicianos e de todo o género de autoridade. A atmosfera de vigilância e denúncias mútuas, que o Departamento do Trabalho Ideológico incentivava submergia qualquer iniciativa, quer positiva, quer negativa.
A abertura económica e o consequente aumento da competição entre os indivíduos têm, necessariamente, que trazer novos desafios nestas matérias. Ouso dizer que, mesmo Samora, se fosse vivo nos dias de hoje, teria que enfrentar maior criminalidade e corrupção, fenómenos que, a meu ver, independem da personalidade e perfil de Samora tendo, isso sim, a ver com o relaxamento da pressão colectivista da sociedade e mais incentivos à iniciativa e promoção do individuo. Tem a ver com a eliminação dos controles que um dia tivemos com os chefes das 10 casas, chefes de quarteirão, milicianos e outros agentes omnipresentes no modelo de ontem competentemente chefiado pelo Camarada Jorge Rebelo propugnava com denodo. Já diz meu amigo PC Mapengo num texto lindo intitulado "Manifesto Político" “Saudades sim mas ninguém quer voltar porque não podemos esquecer o tempo que passou... eram bons tempos aqueles que ninguém quer mais voltar.”

quarta-feira, 20 de outubro de 2010

E se Mudássemos os Critérios Salariais?

As minhas actuais funções dão me o privilégio de organizar e/ou participar em muitas reuniões. Há dias participei numa da qual, entre outras coisas, retive uma reflexão interessante no sentido do exposto no título deste post.

Sugeria um dos participantes que se deve mudar o paradigma salarial no país: as pessoas não devem ser pagas pelo que sabem; devem ser pagas pelo que fazem com o que sabem.

Interessante não é?

Nestes termos não bastaria o diploma para almejar salários altos; seria necessário usar (bem) os conhecimentos atestados pelo diploma para almejar tais níveis salariais.

Eu acho interessante…fecharia a corrida ao diploma para abrir a corrida ao conhecimento com ganhos para o país e, em especial, para a função pública que está (e estará) num processo de reforma.

sábado, 16 de outubro de 2010

Vamos Combater a Credulidade (8a) Dos das Correlações

Retomo a abordagem feita aqui sobre a nossa postura no debate, recorendo de novo aos textos do professor Elísio Macamo com o título acima.



Vamos combater a credulidade (8a) Dos das correlações
E. Macamo

Vou ter que discutir o tema das correlações em três textos seguidos. Acho importante fazer isto porque a problemática que vou tratar tem estado, do lado académico, no centro de como abordamos um bom número de fenómenos sociais no nosso país. O tipo de argumento que me interessa, e que pode fomentar a credulidade, consiste em chegar a conclusões a partir da constatação de correlações e partir dessas correlações para uma causa. No fundo, não há nada de errado neste procedimento e, aliás, a responsabilidade pelas conclusões que são tiradas não pertence aos autores, mas sim a nós os leitores que preferimos dá-las por adquirido.


Existe, felizmente, um trabalho científico da autoria do Professor Carlos Serra do Centro de Estudos Africanos da Universidade Eduardo Mondlane com o título Cólera e Catarse, realizado em 2002 na província de Nampula, que, em minha opinião, usa este tipo de argumento. Talvez seja bom dizer de imediato que a minha análise não põe em causa a autoridade científica do autor. Faço este reparo porque quando publiquei este texto pela primeira vez na internet houve reacções bastante agressivas de gente que ignorou os reparos metodológicos que fiz e preferiu questionar as minhas motivações. Que a crítica por pares faz parte da vida académica passou completamente despercebido a essas pessoas. Sendo o Professor Serra o sociólogo mais produtivo ao nível da pesquisa no país e, ainda mais, debruçando-se sobre fenómenos de grande interesse público – e politicamente relevantes – é importante não só prestar atenção ao que ele diz, mas proporcionar aos interessados instrumentos com os quais eles possam digerir essa produção sem caírem na credulidade como alguns têm, infelizmente, feito.


Vou começar por expôr a obra de forma breve e, no artigo a seguir a este, vou tecer comentários à sua volta. O estudo debruça-se sobre os ataques contra agentes de saúde em Nampula perpretados por populares que acreditavam que estes eram quem causava a cólera. Segundo os autores – a pesquisa foi feita por uma equipa de investigadores – a crença popular (de que a cólera é introduzida pelo governo através do cloro) não é algo irracional como alguns de nós nos sentiríamos inclinados a crer. Ela documenta uma crítica popular ao Estado que não é dialogante, é ineficaz na solução dos problemas do povo, é representado por funcionários alheios aos anseios do povo e tudo isto num ambiente de privações. Na verdade, segundo o estudo a crença pode ser irracional do ponto de vista da explicação científica das causas da cólera, mas perfeitamente coerente com aquilo que os autores do estudo chamam de “consciência de privação”.


De certa forma, portanto, o estudo diz-nos que esta crença é o resultado de um Estado, digamos, problemático contra o qual os populares reagem. Do ponto de vista formal, a estrutura do argumento é simples e consiste de uma premissa apenas. A premissa diz que existe uma correlação entre A (natureza do Estado) e B (crença popular). A conclusão é de que A é a causa de B. A hipótese formulada para o estudo gira em torno deste argumento: “A crença de que a cólera é introduzida pelo governo em Nampula através do cloro (fenómeno) é um indicador de insegurança popular (nível 1) ampliada pela tensão política (nível 2).”. Já na preparação da problemática os investigadores haviam anunciado a intenção de “desnudar o mito da cólera” através da obtenção de “... conhecimento das opiniões dos cidadãos sobre o Estado no concernente à prestação de serviços essenciais como água, saúde e educação”. O estudo confirma o nível 1 (a crença como indicador de insegurança popular), mas não encontra sustento para o nível 2 (a crença é ampliada pela tensão política).


Para este efeito, os investigadores entrevistaram várias pessoas em alguns distritos da província de Nampula. Essas entrevistas produziram depoimentos muito interessantes que, na interpretação dos investigadores, revelam um mal-estar popular em relação ao papel do Estado. Os dados obtidos desta maneira em todos os distritos inquiridos convergem na apreciação negativa do papel do Estado e de algumas ONGs, por um lado, e na reacção que consiste em atacar os agentes do Estado e das ONGs como vectores do mal. O estudo critica duramente aqueles entrevistados, na sua maioria representantes do Estado, que atribuem a acção popular ao analfabetismo e à ignorância. Ele tenta mostrar que a crença não tem nada de irracional, mas é uma reacção à indiferença e oportunismo dos agentes do Estado. Os leitores que acompanham a produção do autor principal vão notar que se trata, na essência, do mesmo argumento que é utilizado para explicar os linchamentos e, porque não, distúrbios como os de 5 de fevereiro e 1 de setembro: falta de confiança no Estado, logo, reacções populares bizarras encontram a sua lógica no comentário crítico que tecem sobre esse Estado. Amanhã vou prosseguir com uma leitura crítica.

Vamos combater a credulidade (8b) Dos das correlações
E. Macamo


Como ler criticamente um estudo tão bem feito como este? Ainda há espaço para distância crítica? A correlação entre apatia do Estado e crença no mito da cólera é, nos dados apresentados pelo estudo, tão elevada que não pode haver outra maneira de interpretar os resultados. Existem basicamente três estratégias para interpelar criticamente este tipo de argumento. Todas elas consistem em perguntas. A primeira pergunta é a seguinte: será que existe mesmo uma correlação entre A e B? A segunda não menos importante é a seguinte: haverá alguma razão para supor que a correlação não seja simplesmente pura coincidência? Finalmente, a terceira pergunta é: é concebível que haja um terceiro factor (digamos C) que constitui a causa de A e B? Esta última pergunta não é inocente. Na verdade, há muitas correlações que fazemos no quotidiano e que se explicam, muitas vezes facilmente, com recurso a uma terceira variável. Por exemplo, podíamos associar a quantidade de estragos num incêndio ao número de bombeiros que o debelaram e concluirmos que os bombeiros são a causa do estrago. Contudo, pode ser que o tamanho do incêndio tivesse exigido mais bombeiros pelo que o próprio tamanho é que seria responsável pelos estragos. Por conseguinte, a nossa distância crítica tem que nos conduzir a eliminar outros factores que possam estar por detrás da correlação imputada. Pensar criticamente significaria, neste caso, justamente eliminar esses factores.


Colocadas as coisas desta maneira, podemos começar a ver alguns problemas com o estudo. Em relação à primeira pergunta (será que existe mesmo uma correlação entre A e B?) podemos, socorrendo-nos dos dados facultados pelo estudo, dizer que de facto existe uma correlação entre a apatia do Estado e a crença popular. Os vários depoimentos são prova disso. Abro aqui, porém, um parêntesis para dizer que seria interessante perguntar também se em todo o lado onde se manifesta este tipo de crença o Estado é visto como sendo apático ou, dito de outra maneira, porque sendo o nosso Estado geralmente apático (suponhamos) não se verificam estas crenças noutros pontos do país com a intensidade que elas têm em Nampula? Estas perguntas são particularmente pertinentes na consideração da terceira pergunta mais adiante.
A resposta à nossa segunda pergunta (haverá alguma razão para supor que a correlação não seja simplesmente pura coincidência?) é menos linear. Há um investimento normativo muito forte por parte dos investigadores para estabelecer a responsabilidade do Estado. A (ir)responsabilidade do Estado é a resposta padrão dos estudos feitos pela Oficina de Sociologia. Porque há linchamentos? Porque há privatização da justiça face à inoperância do Estado. Porque as pessoas frequentam as igrejas pentecostais? Porque estão a reagir à ausência do Estado cuja responsabilidade é escondida pelo discurso da culpa pessoal das preces feitas nessas igrejas. O que quero dizer com isto é que o estudo foi feito com a intenção de “desnudar o mito da cólera” através da obtenção de “... conhecimento das opiniões dos cidadãos sobre o Estado no concernente à prestação de serviços essenciais como água, saúde e educação”. Conhecidas que são as “insuficiências” do nosso Estado, era concebível que o discurso popular fosse diferente do apurado? Não me parece. Em certa medida, portanto, o estudo confirmou a sua própria profecia.


Contudo, há aqui e ali elementos interessantes que vão sobressaíndo dos depoimentos populares. Por exemplo, fala-se de conflitos entre duas interpretações do Islão; fala-se de conflitos entre os jovens e os mais velhos; fala-se de conflitos entre mulheres e homens, embora (tendo em conta o facto de se tratar de sociedades matrilineares) me pareça haver exagero na apresentação da novidade do protagonismo feminino. Estes conflitos são secundarizados no estudo e não merecem a atenção prolongada dos investigadores. O que me parece uma pena. Na verdade, teria sido interessante cruzar estes conflitos com o perfil social daqueles que se envolveram no ataque aos agentes da autoridade e procurar saber se aí também há correlações a fazer. É verdade que do ponto de vista da pesquisa seria difícil encontrar pessoas que tivessem a coragem de dizer que cometeram delitos, mas mesmo assim a partir dos depoimentos teria sido possível estabelecer correlações entre estes outros conflitos e as crenças. Os autores não fizeram nada disso e esta omissão parece-me constituir o calcanhar de aquiles de um estudo que, de outro modo, é um excelente exemplo da pesquisa social empírica. A responsabilidade, porém, não está nos autores, mas naqueles que vão ler o estudo sem procurar interpelar as suas conclusões para além do que foi dito.


À terceira pergunta (é concebível que haja um terceiro factor (digamos C) que constitui a causa de A e B?), para voltarmos à vaca fria, podemos responder afirmativamente. Podíamos dizer que a crença em si é manifestação de ignorância ou de estruturas tradicionais de pensamento, mas que isso em si não é fundamental. O que é fundamental é explicar a reacção violenta na sequência da crença. Aí podíamos dizer que quer a reacção violenta, quer a apatia do Estado são fenómenos que são explicados pelo desmoronamento das estruturas de autoridade naquela região de modo que a nossa atenção não se deve cingir apenas às críticas ao Estado, mas às transformações que ocorrem naqueles meios. E, de facto, os vários outros conflitos mencionados, mas não aprofundados, revelam que a questão da autoridade é fulcral. É interessante notar que as pessoas, no fundo, sabem que o cloro não causa a cólera. Desconfiam das intenções dos representantes do Estado, mas esta desconfiança não explica a sua reacção violenta. No artigo a seguir fecho esta mini-série de três artigos.

segunda-feira, 11 de outubro de 2010

Uma Medida de Grande Alcance

Somos muitas vezes críticos quando o nosso Governo tarda em tomar determinadas medidas ou quando toma outras cujo alcance e/ou oportunidade se questiona, porém nos omitimos de emular boas decisões que são igualmente tomadas. Fiquei agradavelmente surpreendido por uma declaração do Ministério da Justiça, segundo a qual o cidadão não precisa se dirigir a um cartório notarial para proceder a autenticação de fotocópias.

Ao que percebi, tal declaração funda-se no disposto no art. 56 do Decreto n.º 30/2001, de 15 de Outubro que preconiza que “A conferência de fotocópias pode ser feita gratuitamente nos serviços da Administração Pública onde devem ser entregues, desde que seja exibido simultaneamente o original do documento. O funcionario que confirmar a autenticidade da fotocópia deve declarar por escrito que confere com o original, assinar e datar.”

É uma medida que se enquadra no âmbito da reforma do sector público e devia ter sido implementada ainda na primeira fase deste processo mas, só agora é que é publicamente divulgada. É possível que a equipe do Ministério da Justiça ainda estivesse a fazer contas das taxas que deixaria de obter por força de tão “radical” imperativo legal, mas vale mais tarde do que nunca.

Infelizmente, os “vivas” dados a saudar a medida foram, até onde pude acompanhar, unicamente no sentido da redução das filas (vulgo “bichas”) nos notários, principalmente na época das matrículas. Mas, mais do que a simples questão das filas, há um conjunto de benefícios que esta medida encerra.

É um facto que a Administração Pública deixa de arrecadar 5/7 meticais por cada autenticação mas o cidadão a quem esta Administração serve, poupa nos seus já parcos recursos mais do que 5/7 meticais: poupa igualmente o valor do chapa (lembremos que os cartórios notariais, pelo menos em Maputo e em quase todas principais cidades localizam-se na zona urbana/cimento, sendo que a população reside fora desses centros), poupa em algo cujo valor é inestimável que é o tempo e pode capitalizar isso para outras actividades mais produtivas e rentáveis.

Com isto ganha o Estado (considerado na sua vertente territorial, do poder político e da população indispensável no conceito) a partir da decisão administrativa de “libertar” o povo da “chatice” das filas e do gasto do dinheiro que passa a ser poupado para outros fins (lembremos que os motins de 1 e 2 de Setembro, foram igualmente justificados pela subida de pão em 1 metical, valor excessivamente alto para o mais comum dos cidadãos moçambicanos).

Ganha o Ministério da Justiça que terá os seus funcionários libertos para outros actos notariais que, provavelmente, sejam mais importantes e com maior possibilidade de geração de receitas do que as conferências de fotocópias.

É enorme o alcance desta medida. Se calhar este meu post não alcance tal na sua plenitude mas, se calhar também, podemos iniciar aqui um processo da construção do alcance desta medida.

É evidente que ao Ministério da Justiça continua o desafio de oferecer mais e melhores serviços públicos lá onde a população reside e deles precisa. Esta medida pode até contribuir para minorar o crónico problema de transporte. Imaginemos um residente no Zimpeto que precisa dos serviços de um notário: o mais próximo situa-se no Alto-Maé. Tem que apanhar “chapa” e esperar a boa vontade do chapeiro para não encurtar a rota e… enfim. Creio que caminhamos para lá. Ainda bem que o Vice da Justiça espreita os nossos blogs e é nosso companheiro de batalhas várias.

quarta-feira, 6 de outubro de 2010

Em Que é que Darão as Eleições na OJM?

Depois da candidatura de Basílio Muhate a liderança da OJM lançada há alguns dias e referida e comentada aqui, com o processo de apresentação de candidaturas a encerrar hoje, mais dois candidatos se apresentam à corrida: Manuel Formiga e Sérgio Matos.

Se, conforme referido aqui, Basílio Muhate pretende "imprimir nova dinâmica no seio da organização, motivando-a para enfrentar os desafios da actualidade: pobreza, habitação, empreendedorismo e o elevado custo de vida", apostando numa “OJM que seja parte integrante da solução dos problemas do país,” “aberta e inclusiva, englobando os diferentes estratos sociais” ao mesmo tempo que quer “juntar toda a camada juvenil” para atacar os problemas que afligem a juventude do país, os outros candidatos já lançaram o seu repto.

Sérgio Matos tem como objectivos estratégicos a “agricultura, dominando os meios e instrumentos de produção para um desenvolvimento sustentável, no contexto da luta contra a pobreza.” Este candidato se compromete a “promover uma habitação condigna, acessível e bonificada para os jovens, através do estabelecimento de parcerias público privadas.

Por sua vez, Manuel Formiga, pretende “instar a juventude a participar de forma activa, com projectos concretos, no processo de desenvolvimento.” Formiga diz saber que “temos hoje uma agenda nacional concreta, daí a necessidade de consciencializar todos os jovens para a necessidade de se envolverem em projectos concretos e em acções concretas de combate à pobreza” e se propõe a “capacitar do ponto de vista institucional as nossas bases, refiro-me aos distritos e postos administrativos, para que, efectivamente, a juventude possa participar de forma proactiva nos desafios de hoje, que nós assumimos como sendo aqueles que são os grandes problemas da juventude, nomeadamente a habitação e o acesso ao emprego. De mãos dadas, queremos superar essas dificuldades.”

Estão lançadas as intenções para os membros da organização que tem o dever de sufragar um de entre estes três candidatos para dirigir a organização num determinado mandato.

O eleito deverá ser aquele que, conhecedor da natureza, especificidades e objectivos da organização nos dias que correm e numa perspectiva de futuro, apresente o melhor programa, que seja realista e/ou se apresente ao eleitorado como a melhor solução para a organização.

Tenho reais expectativas neste processo. Tenho noção do que eu gostaria que saísse deste processo conforme referi no post anterior sobre a OJM. Tenho a impressão de que podemos aproveitar o esgrimir de argumentos entre os três candidatos da OJM para todos nós, enquanto jovens, repensarmos o nosso papel perante a nação e os desafios que nos esperam pela frente. Podemos aproveitar o debate que se seguirá para, sugerir estratégias, abordagens, acções, lobbies e outras formas de participação, afinal, deste conjunto de jovens que se pretendem irreverentes (como característica própria da juventude) no discurso, nas acções a empreender, sairá aquele que de dentro do Partido governante e maioritário tem maior potencialidade de influenciar decisões que podem ter influência na vida de todos nós.

Debate? Sim. Creio que haverá debate. Me parece que Basílio se predispõe a isso. Quando num dos comentários no meu post anterior ajunta que “queremos trabalhar com todos e colaborar com todos e dialogar com todos...bons e maus, militantes e não militantes, público em geral...e com a juventude Moçambicana...” mostra essa vontade não só agora como quando for eleito SG da OJM.

Debate sim porque mais do que o Basílio que foi o primeiro, temos agora o Matos e o Formiga com intenções de serem também SG com base num programa que apresentarão para sufrágio dos delegados e, sendo uma organização de jovens questionadores por natureza, procurarão saber das estratégias de materialização do que cada um promete, qual galã apaixonado.

De certeza se procurará saber do Matos a questão do “estabelecimento de parcerias público-privadas”; o significado disso tendo em conta a natureza da OJM. De certeza se questionará ao Formiga o seu entendimento sobre a “agenda nacional concreta” que é a luta contra a pobreza e as estratégias inovadoras que ele propõe, não só a juventude, mas, também, aos decisores políticos para que essa luta seja mais eficaz e retire da condição de pobre mais de metade da população que como se sabe, é coberta pela faixa etária que a OJM representa. Procurar-se-á saber do Basílio como é que uma estratégia “inovadora e proactiva,” aliada uma nova atitude e rigor, com critérios claros na gestão e planeamento institucional a implementar na OJM pode ter os reflexos esperados para a Juventude e como isso pode ser replicável a todas organizações com reflexos para o país na esfera da liderança da OJM a toda uma juventude.

Das respostas as questões que forem colocadas em sede própria pelos jovens da Frelimo aos candidatos a liderança da sua “J” bem como do debate paralelo que podemos iniciar inspirado neste podemos atalhar caminho e descobrir em que é que poderão dar estas eleições. Eu tenho o meu palpite de que destas eleições emergirá uma OJM diferente, com “uma nova atitude e rigor”, com critérios e ideias claras sobre o que se pretende com esta juventude que pode se assumir como dona dos destinos desta nação e impulsionadora de políticas, actos, soluções de que o país ainda carece para o almejado desenvolvimento. Tenho o meu palpite quanto ao vencedor. O meu palpite baseia-se em vários factores, sendo um deles a predilecção por quem coloque a organização como “parte integrante da solução dos problemas do país” e não como a própria solução… infelizmente não voto.

sexta-feira, 1 de outubro de 2010

Qual Tem Sido a Nossa Postura no Debate de Ideias?

A blogosfera e outros canais de debate estão em efervescência nos últimos dias; esgrimem-se argumentos vários sobre os mais diversos fenómenos algo que julgo salutar. Acontece porem que, muitas vezes, a nossa postura e/ou argumentos nesse debate sao problemáticos. Por essa razão, na perspectiva de os tomarmos como ponto de partida para avaliarmos a nossa postura no debate dos mais diversos fenómenos, decidi trazer para este espaço, dois textos do professor Elísio Macamo ja publicado no matutuino Noticias.

Qual tem sido a nossa postura no debate de ideias? Como nos posicionamos em relação a argumentos contrários? Que critérios, para cada um, atribuem plausibilidade e geram “simpatias” nos argumentos dos outros?

Antes, se calhar, trazer os dois textos:

Vamos combater a credulidade (2) Dos da plausibilidade
E. Macamo

Porque é que argumentos problemáticos passam com tanta facilidade na nossa esfera pública? Um palpite que eu tenho conduz-me à noção de plausibilidade. É um pouco difícil defini-la, mas diria que é algo que está ligado ao tipo de suposições que nós fazemos em relação ao que ouvimos quando não estamos em condições de verificar tudo tim-tim por tim-tim. Se alguém nos diz que o paiol de Malhazine explodiu por desleixo, aceitamos por acharmos que isso encaixa muito bem na ideia que temos do funcionamento das nossas instituições. Isto é, fazemos uma suposição qualificada sobre a veracidade de uma afirmação que, do ponto de vista prático, pode ser considerada verdadeira na ausência de provas em contrário. Em relação ao paiol, por exemplo, consideramos plausível a ideia de que se trate de desleixo na ausência de outros elementos que poderiam mostrar o contrário. Aceitamos, portanto, a afirmação como sendo provisoriamente certa.

O nosso dia-a-dia está cheio deste tipo de argumentos. Eles obrigam-nos a usarmos o nosso senso-comum para decidirmos se vamos acreditar numa afirmação ou não. A base dessa crença (e desse senso-comum) é o que não fere o nosso sentido do que é normal. Sei que a coisa fica um pouco complicada, porque o que é normal entre nós não é assim tão fácil de determinar. Eu diria, por exemplo, que se alguém me viesse dizer que viu uma pessoa a voar esse relato estaria a violar o meu sentido do que é normal. Sei, contudo, que para outras pessoas isso não seria assim, aliás Quisse Mavota mostrou isso. Não obstante, este é um caso que não precisa de nos deter por muito tempo, pois está mais relacionado com a questão da coexistência de várias referências ontológicas no nosso quotidiano. O importante é reconhecer o papel que o nosso senso-comum desempenha na determinação da plausibilidade de uma afirmação e, como exercício crítico, confrontar esse senso-comum.

Na verdade, os nossos problemas com a plausibilidade na esfera pública começam quando confiamos demasiado neste senso-comum. Se alguém nos diz que os distúrbios de 1 de setembro eram protestos de gente afectada pela carestia da vida reagindo a um governo arrogante e o nosso senso-comum nos diz que há carestia e o governo é arrogante, então concluimos que de facto essa foi a causa dos distúrbios. Reparem que, em princípio, não é inconcebível que assim seja, mas no fundo a nossa única base de inferência é apenas o senso-comum. Portanto, argumentos plausíveis são frequentes, mas terrívelmente inseguros. Deixá-los ficar pela plausibilidade é o pior que podemos fazer no espírito da elevação da qualidade do debate.

No fundo, o que a plausibilidade nos diz é que precisamos de mais informação, pois um argumento plausível é um argumento provisório. Com mais informação, sobretudo informação que contraria a nossa afirmação, podemos talvez rever a nossa aceitação da conclusão. A questão que deveríamos colocar antes de fazer eco ao que é plausível é de saber o que precisaríamos de saber para estarmos seguros de que a conclusão segundo a qual os distúrbios foram protestos de gente afectada pela carestia da vida perante um governo arrogante é mais do que plausível. É sintomático que no calor das manifestações nenhuma das pessoas que escreveu textos de análise incendiários a sugerir esta explicação falou com os perpretadores. Há quem simplesmente somou 2 mais 2 e concluíu que só podia ser isso. Agora, atenção que com isto não quero dizer que não tenha sido isso (não sei o que foi), nem mesmo que não tenha havido pessoas que se fizeram à rua movidas por essas ideias.

O que está em causa é a nossa responsabilidade crítica como membros da esfera pública. Estamos dispostos a entrar em confrontação com o que nos é dito ou não? De que maneira o podemos fazer? Batendo simplesmente palmas? Defendendo? Ou interrogando o nosso senso-comum, fonte da plausibilidade do argumento que nos é servido? Penso que a interrogação do nosso senso-comum é o caminho. Interrogamo-lo simplesmente procurando uma base de informação mais sólida. Esta sugestão, por acaso, não vale apenas para o argumento do protesto. Vale também para a sugestão feita pelo Ministro do Interior, segundo a qual estaríamos perante bandidos. Olhando para o tipo de acções que caracterizaram os distúrbios podemos conferir plausibilidade a essa descrição. Mas para que ela seja mais do que plausível seria necessário olhar para a forma como a manifestação decorreu, comportamento da polícia e de diferentes grupos de manifestantes. Aqui também poderíamos constatar que se tratou mesmo de bandidos, ou não. Normalmente, quando vamos para além da plausibilidade colocamo-nos em posição de diferenciar e qualificar os nossos argumentos. Diferenciar e qualificar são coisas muito importantes para a saúde do debate. Nos nossos jornais e na internet anda muita gente que não vê virtude nisto.

Vamos combater a credulidade (3) Dos comprometidos
E. Macamo

A credulidade tem várias manifestações (não confundir com “distúrbios”). Uma delas, sobre a qual me debruço neste texto, é de argumentar a partir duma posição de compromisso. Eu explico. Algumas intervenções no debate sobre os distúrbios de 1 de setembro foram no sentido de dizer que a carestia de vida é tanta que um pobre não tem outra alternativa senão revoltar-se violentamente. A credulidade intervem aqui para nos dizer que sim, essa situação explica tudo; ou que não, isso não explica nada. No primeiro caso queremos acreditar que sim enquanto que no segundo queremos acreditar no contrário. Antes de eu analisar os problemas inerentes à esta atitude vou explicar a natureza do argumento envolvido um bocadinho mais. A essência vai no sentido de dizer que a posição que uma determinada pessoa ocupa na sociedade (podia também ser a filiação religiosa, política, etc.) obriga-a a agir duma única maneira se não quiser ser incoerente. Um pobre, porque pobre, só pode reagir à carestia revoltando-se.
O argumento contém três elementos. O primeiro é, por assim dizer, uma premissa que contém provas da existência de um compromisso. Por exemplo, os “manifestantes” são pobres (afinal estavam a reclamar a subida de preços, vivem em bairros periféricos, dependem de chapa, etc.). Podíamos representar formalmente esta premissa com a seguinte frase: f (fulano de tal) tem compromisso com posição x de acordo com certas provas ao nosso dispôr (as condições sociais em que vive). O segundo elemento continua a ser uma premissa, mas desta feita o que ela faz é articular o posicionamento com uma outra coisa. Por exemplo: um pobre revolta-se quando a carestia da vida aumenta. A forma seria: normalmente, a posição x implica também posição y. Ou seja, um pobre (posição x) revolta-se quando a carestia de vida aumenta (posição y). Destas duas premissas resulta a conclusão deste argumento com base no compromisso, nomeadamente que f (fulano de tal) por ser x tem que fazer também y. Em moçambiquês: um verdadeiro pobre deve revoltar-se quando a carestia da vida aumenta! Esta conclusão é violenta porque impõe limites ao que podemos dizer, fazer ou pensar em virtude do lugar que ocupamos na sociedade. Corremos o sério risco de sermos acusados de incoerência se fizermos ou dissermos coisas que não encaixam na expectativa criada por este argumento. Se um indivíduo, apesar de ser pobre, dissesse que não é com manifestação que o problema se resolve, achamos que podemos com legitimidade levantar sérias interrogações em relação à genuidade da sua condição. Dizemos, indignados, que um indivíduo que diz isso não pode ser pobre! E este tem sido o problema nas nossas discussões na esfera pública. Ou obrigamos as pessoas a aceitarem as implicações práticas de ocuparem certos lugares na sociedade ou então a reconhecerem que estão a ser incoerentes.
Há saídas para este dilema. A primeira saída é simples. Que provas são essas que demonstram que f tem compromisso com posição x? No caso do pobre a coisa é simples. A situação está difícil no país e aquele que é pobre não pode esconder a sua condição. Nem tem necessidade de o fazer. Mas o conceito de pobre é vasto demais para poder comprometer todo o indivíduo que possa assim ser descrito. Há pobres muçulmanos, presbiterianos, católicos, ateus, operários, empregados domésticos, mulheres, jovens, do sul, da Frelimo, que vivem neste e não naquele bairro, etc. Cada uma destas pertenças ou identidades é um quadro de referência normativa que age sobre cada um desses indivíduos e impõe limites ao que ele faz ou pensa que devia fazer. Esta complexidade da noção de pobre não permite a ninguém deduzir o seu comportamento simplesmente a partir da constatação de que alguém é pobre. Há pobres que de certeza acreditam no respeito de propriedade alheia e na ordem. Não são vítimas de falsa consciência. São assim e ponto final. O uso indiscriminado da categoria de pobre para explicar porque algumas pessoas reagiram de forma violenta à carestia da vida (partindo do princípio de que esse foi o caso) parece-me assim problemático.

A segunda saída é central. Haverá excepções à regra segundo a qual a posição x implica posição y? Por exemplo, se um determinado pobre achar que certos pobres - com os quais ele devia solidarizar-se por ser também pobre - comportam-se duma maneira que viola os seus valores e, por causa disso mesmo, achar que lhes devia recusar a sua solidariedade, ele poderia dizer que ao fazer isso não estaria a ser incoerente consigo próprio porque o seu entendimento da conduta moral dum pobre obriga-o a condenar certas posturas. É verdade que algumas pessoas podem insistir com um princípio geral que diz que um pobre, independentemente das circunstâncias e da conduta de outros pobres, deve ser solidário com outros pobres. Aí, contudo, já estamos a entrar numa área que ultrapassa os limites da atitude analítica. Já não se trataria de reflexão crítica, mas sim de obediência. E na verdade, uma grande ameaça que páira sobre as nossas sociedades é este compromisso cego com certos princípios normativos gerais. É esta ideia nociva de que aquilo que consideramos correcto é correcto para toda a gente e em todas as circunstâncias.

terça-feira, 28 de setembro de 2010

Quando Obama Elogia Moçambique

É público que Barack Obama elogiou Moçambique e outros países afirmando que "É a força que transformou a Coréia do Sul a partir de um beneficiário do auxílio de um doador de ajuda. É a força que tem elevados padrões de vida do Brasil para a Índia. E é a força que permitiu a países emergentes Africanos como a Etiópia, Malawi e Moçambique desafiar as chances e fazer um progresso real no sentido de alcançar os Objectivos do Milénio, assim como alguns de seus vizinhos - como a Cote d'Ivoire - tenham ficado para trás. "

É bom lembrar que, há poucos meses, o representante dos EUA em Moçambique era o tocador do tambor barulhento no “motim” provocado pelos nossos “parceiros” estratégicos que, segundo alguns peritos no assunto, ajudou a potenciar ou está entre as causas da crise que vivemos de momento.

Mas o que é que significa este elogio? O que é que de facto encerra? Para além dos esforços que tem sido empreendidos, não desde Janeiro de 2010 mas já a algum tempo, haverá alguma coisa mais que “precipite” tamanho elogio por exemplo: o desenvolvimento dos trabalhos no Vale do Rovuma ou a pujança com que a China se envolve com África e Moçambique em particular?

Apesar destas dúvidas quanto a motivação de um discurso deste género 9 meses depois de, o mesmo país, ter sido severo nas suas críticas ao país, não tenho dúvidas de que há trabalho que tem sido feito internamente para erradicar a pobreza. Não tenho dúvidas de que, de alguma forma esse trabalho se reflecte na vida das pessoas. Não tenho dúvidas de que continuamos longe de poder tirar o pé do acelerador e relaxar na longa “marcha” pelo bem estar dos moçambicanos.

Aliás, mesmo o Presidente da República está ciente de que há muito que fazer. Reagindo aos elogios, AEG disse que essas declarações “mostram claramente que o país está a avançar rapidamente”, apesar dos problemas existentes e que são típicos do processo de desenvolvimento. Isto é, o PR tem noção de que há ainda problemas a ultrapassar.

Segundo o Presidente moçambicano, as declarações de Barack Obama mostram que os Estados Unidos da América (EUA) têm estado a acompanhar esses progressos.

Seja qual for o móbil, é um elogio vindo de um dos nossos parceiros que foi crítico ao país no início do ano. Seja como for, custa me constatar a ausência das vozes e canais que, internamente, são contestatárias da realidade referenciada pelo Presidente Obama. Estranho o silêncio daqueles que, permanentemente, preferem passar a ideia de que, o Governo moçambicano falta à verdade, quando diz que as suas políticas de combate e erradicação da pobreza estão a surtir efeitos desejáveis.

Pode ser que os consiga trazer aqui. Espero por eles todos: Reflectindo, Machado, Couto, Langa, Mabunda e outros que não os vi tão activos como seria se Obama tivesse dito o contrário do que disse.

terça-feira, 21 de setembro de 2010

Que Desafios ao Novo SG da OJM?

Começou a corrida rumo a eleição do novo Secretário Geral da Organização da Juventude Moçambicana. Já é público que Basílio Muhate manifestou já, formalmente, a intenção de se candidatar ao cargo de OJM, com a pretensão de "imprimir nova dinâmica no seio da organização, motivando-a para enfrentar os desafios da actualidade: pobreza, habitação, empreendedorismo e o elevado custo de vida."

Impõe-se, de facto, a necessidade de imprimir uma nova dinâmica no seio da organização; o assumir de uma postura mais irreverente (própria da juventude) quer no discurso, quer nas acções a empreender, que galvanizem a juventude quer no seio do Partido Frelimo quer fora deste.

Fora do Partido Frelimo? Sim. Tenho a convicção de que uma OJM com uma orientação clara, com um projecto exequível e um conhecimento profundo dos desafios que se afiguram pode aglutinar a volta de si mais do que os jovens frelimistas mas, também, os que não se revêem em nenhum partido ou mesmo os que são membros de outros partidos.

É que, penso eu, não existem problemas e/ou soluções exclusivas à juventude da Frelimo. Existem desafios comuns de uma juventude que pode, a maioria dela, se rever na “nova” OJM a emergir das eleições que se avizinham, assumindo como seu um projecto que esta “nova” OJM oferecer a juventude.

Nesta perspectiva, é de louvar o discurso do, até agora, único candidato conhecido (pelo menos por mim) nesta corrida que aposta numa “OJM que seja parte integrante da solução dos problemas do país,” “aberta e inclusiva, englobando os diferentes estratos sociais” ao mesmo tempo que quer “juntar toda a camada juvenil” para atacar os problemas que afligem a juventude do país.

Esta postura, a vingar, será benéfica a toda uma classe. A OJM, ao juntar no diálogo anunciado “toda a camada juvenil” para a compreensão dos desafios do momento, chave mestra para a concepção de soluções eficazes, poderá constituir-se e/ou tornar-se num espelho no qual a juventude se reveja na busca de soluções para os seus problemas, e como interlocutor válido a todos os níveis, incluindo dentro da estrutura que actualmente define e concebe as principais políticas do país.

Tudo isto requer um programa arrojado; um programa assente num estudo profundo dos desafios do momento e numa capacidade de colocar os desafios e as soluções propostas na agenda dos decisores a nível nacional.

Isto também requer um discurso forte e irreverente que, sem quebrar com as normas internas da organização maior a que pertence, mostre que se trata de uma organização com princípios, normas e causas por defender. Um discurso que não soe a repetição do discurso do Partido, mas um discurso que possa, inclusive, influenciar ele mesmo o discurso da organização maior que é este último.

Portanto, entendo que o desafio maior é o da afirmação cada vez mais expressiva da OJM como potencial líder de uma juventude sedenta de soluções para os inúmeros desafios com que se depara. Deverá pois a OJM assumir o desafio de fazer uma revolução no seu funcionamento, discurso, postura e engajamento que produza a viragem que fará desta histórica organização líder de uma juventude sedenta disso mesmo: liderança.
A causa maior da OJM é a própria juventude com os seus desafios de momento. Parece que o Basílio quer assumir esta causa. Esperemos pelos que lhe seguirão na manifestação de interesse em liderar esta histórica organização.

Pena que caminho para os 35… mas não deixarei de apoiar quem quer um projecto assim. Me parece que o Basílio o quer e, acredito, um projecto assim sera abracado nao so por pessoas de dentro do Partido a que pertence mas, também, de fora deste.

segunda-feira, 13 de setembro de 2010

Definindo Estratégias de Comunicação: Urge Falar COM o Povo

Após as manifestações de 1 e 2 de Setembro nas cidades de Maputo e Matola, uma das críticas que se repete diz respeito a deficiente comunicação entre o Governo e o povo. Tem se dito que o Governo fala para o povo e que quando o faz, fá-lo com arrogância, e como forma de sustentacão e/ou exemplificacão chama-se a colação a intervenção do Ministro do Interior a data dos acontecimentos.


Na verdade do ponto de vista das massas, no nosso contexto, não sei que postura se esperava do Ministro do Interior naquele dia e perante aqueles acontecimentos. Porém, sou de opinião de que como político, a postura e o discurso poderiam ter sido outros, mais conciliador e pacificador, reservando-se ao chefe dos polícias, o comandante geral da polícia, ou outro oficial sénior, uma posição mais musculada, caso fosse necessário.

Mas, é sempre fácil fazer juízos a posterior. O silêncio também, se calhar, poderia ter tido consequências mais desastrosas.

Em entrevista ao Jornal o País fim de semana, o professor Elísio Macamo acha que a palavra arrogância muitas vezes usada para caracterizar a postura do Governo "é muito forte.” Diz o professor Macamo que a “acusação de arrogância pode ser uma manifestação de impotência de quem não dispõe de meios para se fazer ouvir no quadro apresentado pela distribuição de voto que temos.” Acresce ainda que “precisamos, também, duma linguagem mais moderada na caracterização do que acontece.”


Em entrevista ao Jornal Domingo, Amilcar Perreira cientista político e docente na Universidade Eduardo Mondlane, entende que da parte do Governo "não há uma estratégia clara de comunicacão e/ou diálogo que ajudaria na actualizacão do cidadão ou populacão sobre os contornos da crise e outros assuntos relevantes."

Até certo ponto concordo com eles e, fundamentalmente, com o apelo do professor Macamo no sentido de que “neste momento de crise precisamos de muito mais do que, simplesmente, uma atitude conciliatória do Governo do dia. Precisamos, primeiro, duma coligação moral de democratas que digam em voz alta que se opõem a violência como processo político.” Muitos dos opinaram durante ou após os tumultos que se pretendiam manifestacão foram sempre no sentido de justificar os actos que iam ocorrendo, secundarizando a condenacão da violência e pilhagem.


De qualquer forma, a meu ver, urge definir um mecanismo claro de comunicação entre o Governo e os governados. Comunicação no sentido de “troca de informação entre indivíduos através da fala, da escrita, de um código comum ou do próprio comportamento”para “permitir uma maior capacidade de entendimento entre as pessoas através do diálogo”conforme define o dicionário online Porto Editora.

Haverá diferença entre falar para o povo e falar com o povo? Creio que sim. Tomemos o exemplo do Presidente da República: (i) fala para o povo nas suas mensagens do fim do ano por exemplo e (ii) fala com o povo nas sessões de presidência aberta.

Quando se fala com o povo permite-se alguma interacção que, com maior facilidade, ajuda na assimilação das mensagens que se pretende passar. Quando se fala para o povo esta interacção, pelo menos directamente, não existe. Apenas enunciam-se ideias cuja assimilação depende do maior ou menor sentido apelativo de quem emite o discurso.

Os fenómenos de 1 e 2 de Setembro remetem-nos para a ideia de que os acontecimentos a nível global devem ser levados a conhecimento dos moçambicanos nos diálogos que se vão tendo com o povo, este povo que, ao contrário do que Machado da Graça pensa, entende muito mais do que de enxada de cabo curto.

Este diálogo não deve ter no PR o único interveniente. Todos os dirigentes, a todos os níveis, devem ser activos no “falar”com o povo disseminando a mensagem cujo desconhecimento pode ter precipitado os tumultos tidos por manifestação nos dias 1 e 2 de Setembro.

terça-feira, 7 de setembro de 2010

Mais Uma Vez Machado da Graça, Mais Uma Vez Desqualificando os Moçambicanos

É interessante a forma como, algumas vezes, Machado da Graça se pronuncia e se posiciona no debate público nacional. Muitas vezes é chocante. Irritante até, quase a chocar ao mais desqualificável desrespeito e despeito por todos nós.

É chocante quando, por exemplo (mesmo que fosse sarcasticamente), nós moçambicanos somos reduzidos a pessoas que “pouco mais conhecem do que a sua enxada de cabo curto,”isto é, ignorantes com quem é impossível qualquer diálogo. É isto que Machado da Graça nos diz na sua crónica de última sexta-feira a propósito das escaramuças havidas a 1 e 2 de Setembro de 2010, uma crónica também reproduzida aqui.

Portanto, se nas presidências abertas o Presidente da República fala com quem não devia falar porque ignorantes, burros já que “pouco mais conhecem do que a sua enxada de cabo curto,” e se na confusão de 1 e 2 de Setembro, diferentemente das de 5 de Fevereiro, não havia interlocutor conhecido, deve haver uma casta especial de moçambicanos iluminados, que devem liderar esse diálogo já que, igualmente, para Machado nem os sindicatos servem já que, “os sindicatos não representam nada nem ninguém.”

Indicou nos o bom do Machado, os burros, os ignorantes as pessoas deste Moçambique “pouco mais conhecem do que a sua enxada de cabo curto”) os que não servem para nada (os sindicatos). Creio que só a modéstia compeliu o nosso conhecido colunista de indicar os que deviam capitanear os ignorantes no diálogo sugerido com o Governo.

Tal como Viriato Tembe com quem concordo, acho “estranho que este inteligente analista venha a chamar os camponeses moçambicanos, a maioria do nosso povo de burro. E exactamente por "pouco mais conhecerem do que a sua enxada de cabo curto" as conversas que estes nossos concidadãos mantêm com as autoridades não são qualificadas, segundo este eminente analista.”

E há quem, apesar de tudo, pensa que as nossas mães, avôs, primas e primos que não falam português nada percebem da vida e dos homens e suas vicissitudes. Pergunta Abdul Karim lá no Reflectindo “Percebem tudo? Está bem, então diga-me lá um camponês que não fala português, como o presidente explica PIB para ele em changana ou outro língua materna”então minha gente, mais de metade da população moçambicana é burra. Que enormidade…

Mas de verdade, apesar de não mais me surpreenderem os posicionamentos deste senhor e outros a ele acolitados, é preciso dizer que estamos sempre atentos. É preciso dizermos-lhes que apesar dos truques retóricos, estamos sempre atentos aos insultos a nossa inteligência e que temos inteligência o suficiente para os dispensarmos para o merecido descanso.

Desengane-se quem pense que estas coisas são novas. Já as denunciei quando em 2003 nos chamaram as mesmas coisas quando, pela imprensa tentaram nos vender a ideia de que os que lutaram pela independência do país o tinham feito pelos mais vis objectivos, substituir-se aos colonos.

Estas manias do Machado da Graça de olhar para os moçambicanos como faz na última crónica, aqueles que “pouco mais conhecem do que a sua enxada de cabo curto,” foi também denunciada por G. Muthisse num texto fantástico intitulado “os amuralhados raciais.”

Mais do que isso, a pregação de um apocalipse anunciado de algo “mais grave”que pode acontecer para além de prenunciar um regozijo sempre que estas coisas acontece, serve também para reforçar o posicionamento destes ilustres senhores, como que a dizer, temos dito, não nos ouvem, estamos aqui, prontos para ajudar.

Mas podemos tomar decisões sem eles. Disso deu exemplo o nosso Governo esta terça-feira.
Bem haja Moçambique cujo povo, apesar de “pouco mais conhecer do que a sua enxada de cabo curto,” ganhou o direito de decidir por si sobre o seu futuro, já lá vão 35 anos ao longo dos quais foi produzindo gente capaz de levar Moçambique para frente, gente da terra que ganhou seu espaço a despeito dos que, durante muito tempo pensaram que o país pararia sem eles. Um deles é Machado da Graça que agora se especializou em dizer mal do Governo e em insultar os moçambicanos, os tais que “pouco mais conhecem do que a sua enxada de cabo curto.”

quinta-feira, 26 de agosto de 2010

Corrupção, Sabemos o que É?

O Governo do dia e, em partuclar, o Presidente da República declararam uma guerra sem tréguas contra a corrupção. Moçambique tem uma legislação que reputo aceitável sobre o assunto. Este assunto que já foi, também, tema privilegiado de inúmeros colóquios, seminários, debates etc. (por exemplo, aqui).

O Rapper Azagaia j’a gritou, numa das suas músicas, “corruptos fora” e multiplicam-se, por aí, canções, discursos, panfletos etc ora denunciando a corrupção e ou corruptos de ocasão, ora instigando Moçambique a lutar contra a corrupção e a denunciar corruptos.

Nada contra. Porém, assusta-me (só de pensar) a ideia de que, se calhar, muitos falam deste fenómeno sem o conhecer/dominar. Assusta-me a ideia de pensar que, se calhar, grande parte da população do meu país não conhece o fenómeno para o qual é chamado a combater, principalmente, quando não poucas vezes se faz confusão entre melhoria de vida e corrupção, como também pelo clássico toda a “gente sabe.”

Estarei enganado? Sabemos mesmo o que é corrupção?

Não seria esta altura de ensinarmos nas nossas escolas o essencial sobre este assunto, desde as primeiras classes, ensinando, ao mesmo tempo, boas práticas aos mais novos numa visão de fututo e de cidadania militante e consciente?

Revejo os livros das primeiras classes e fico com a ideia sobre o como perdemos oportunidade de ensinar estas coisas ao mesmo tempo que vai se mentalizando nas cabeças também da criançada a ideia deturpada de desconfiar de todo que aparente viver bem.

quarta-feira, 7 de julho de 2010

Custa Dialogar Com o Presidente da Republica?

Não posso afirmar com muita certeza, mas o Presidente da República de Moçambique S. Excia Armando Emílio Guebuza deve ser dos poucos presidentes africanos que mantém várias linhas de contacto com os governados. Isso acontece quer atraves das presidências abertas e inclusivas, quer através de um blog que, até onde sei, não tem espécie alguma de censura.

Em tempos escrevi sobre a necessidade de diálogo entre a classe política dirigente e os cidadãos em que os “dirigidos” poderiam, livremente, interpelar os dirigentes sobre as políticas publicas, ideias, apresentar sugestoes etc.

Quando o cidadão Armando Emílio Guebuza, no auge da Campanha eleitoral lançou o seu blog e, através dele, interagia com seus potenciais eleitores, e não só, muitos de nós apelamos que aquele espaço não encerasse com o advento das eleições.

O blog do Presidente da República reeleito continua no ar. Nele continuam a ser publicadas as visões do líder moçambicano o que me enche de alegria.

Infelizmente, apesar da existência deste espaço parece que nos demitimos de interpelar o nosso líder da nação. Perante a oportunidade de podermos dialogar com o PR, simplesmente nos mantemos num mutismo que não consigo perceber.
Perante a hipótese de interpelar a fonte primária da expressão “Geração da Viragem” alimentamos debates intermináveis sobre este conceito, sem irmos, nem se quer a fonte originária (aqui) para avaliarmos o que o seu proponente primário pretende com o tema.
Será medo? De quê?

Porque não destilamos o nosso saber que, incansavelmente, mostramos em debates que ficam no crivo dos nossos emails apenas, discutindo com o PR o seu pensamento sobre o nosso futuro? Porque não aproveitamos a sua abertura para, com urbanidade, propormos a nossa visão do rumo que o país deve tomar?

Porque não pensamos, como aconteceu no início, dos nossos debates podem nascer novas abordagens sobre os mais diversos assuntos?

Ou será que somos de opinião de que o PR não pode ser questionado? Infelizmente, a ser esse o pensamento, perdemos a chance de dialogar com alguém que já mostrou valorar as ideias saídas destes espaços.

quinta-feira, 17 de junho de 2010

Autarquias, Um Vinculo Proximo no Processo Democratico e no Exercicio da Cidadania por Aproveitar

Em Outubro de 2008 escrevi aqui sobre as “Autarquias da Nossa Cidadania” procurando visitar o entendimento que temos do processo de autarcisação do país e as oportunidades que se abrem para a participação cidadã com o processo.

Da leitura da Lei 2/97 de 18 de Fevereiro, que estabelece o Quadro Jurídico para a Implementação das Autarquias Locais, resulta claro que estas visam organizar a participação dos cidadãos na solução dos problemas próprios das suas comunidades e promover o desenvolvimento local, bem como o aprofundamento e a consolidação da democracia.


Dessa forma, os municípios constituem uma oportunidade de como cidadãos conscientes, criarmos um vínculo ao nível mais próximo (Municipal em contraposição ao Nacional) através do qual influenciamos positivamente a tomada de decisões com impacto nas nossas vidas, quer participando na tomada de decisões pelos mais diversos meios ao dispor (cartas, petições, audiências etc), quer, dentro da legalidade estabelecida, exigindo, por exemplo, maior cobertura e melhores serviços públicos dentro das áreas dos nossos municípios.

1. Como tornar próxima esta relação entre o cidadão e o seu Município?
2. Como introduzir a consciência de que, pela sua acção, o cidadão tem, também, responsabilidade em muitas das coisas boas e más que acontecem nos nossos Município? (na gestão dos resíduos sólidos por exemplo, deitar o lixo em lugares apropriados facilita o trabalho dos que tem que fazer a recolha desses resíduos enquanto que, o contrário, dificulta e torna a cidade ou vila suja, feia, objecto de reparos desabonatórios etc)
3. O que tolda a capacidade do munícipe em Participar na tomada de decisões que lhe afectam a nível municipal?

Tal como em Outubro, continuo a pensar que a autarcisação é um veículo que está sendo desaproveitado para o alcance de determinadas soluções para o nosso próprio bem estar.

Parece evidente que as pessoas têm a noção clara do que o Município tem e deve fazer; por exemplo, recolher o lixo, reparar as estradas etc. Estas são reclamações recorrentes dos munícipes de quase todo o país.

Da mesma forma, os municípios clamam por mais meios materiais e financeiros, impelem os cidadãos a pagarem os seus impostos e taxas etc. Porém, em minha opinião, e vendo os objectivos norteadores de todo este processo, creio que mais do que um recolher lixo e outro pagar as taxas e impostos autárquicos, há ainda um longo processo de participação cidadã que deve ocorrer, no qual todos participam na solução dos problemas das suas comunidades apontando o que vai mal, ao mesmo tempo que propõem soluções.

É um desejo que assim seja porém, há ainda um grande déficit de cidadania que não nos permite ainda ganhar consciência do nosso poder enquanto cidadãos e, através dele, encurtar a distância entre as "estruturas" e o "povo." Não falo de manifestações como as que já vimos, nem de acções estilo “lixo na rua” como também já vimos; trata-se de espevitar a nossa veia criadora e apartarmo-nos da visão clássica do espectador que apenas assiste e nada pode fazer para influenciar o desenrolar do espectáculo.

No caso das autarquias há muito que podemos fazer.

Reitero os desafios que coloquei em Outubro no sentido de que é necessário criar (onde não existem) ou aprofundar (onde já existem) mecanismos reais para "aproximar" cada vez mais os munícipes das estruturas criadas nos municípios para a canalização de problemas e as respectivas propostas de soluções. É necessário criar a capacidade de, a cada momento, interpelar os dirigentes (a todos os níveis) com vista a solução dos problemas próprios das nossas comunidades e promover o desenvolvimento local, bem como o aprofundamento e a consolidação da democracia.

segunda-feira, 31 de maio de 2010

FMF vs Mart Nooij

Nunca tinha visto tanto zig-zag para a contratação de um seleccionador para qualquer equipa nacional como está a acontecer agora no caso do futebol.

Os contornos deste assunto há muito são falados. Há muito que se fala, discute-se e especula-se. O que não consigo vislumbrar é como será a convivência caso a posição/opção governamental vingue e Mart seja ou tenha que ser indicado, de facto, seleccionador nacional.
Sidat já disse que “nenhum acordo vai ser discutido com Mart Nooij” e que Mart Nooij há muito que é assunto encerrado na FMF, apesar de existir uma comissão (mais uma) criada pelo Governo e FMF para tratar deste assunto. Está claro que Sidat não quer Mart e espera do dinheiro do Governo para pagar o seleccionador por si pretendido (um tal David Nascimento) e parece evidente que o Governo precisa de outro tipo de respostas para além das que a FMF e Sidat deram para prescindir de Mart para continuar a dar dinheiro para pagar seleccionador. Ariscaria a dizer que o Governo quer Mart.

Neste quadro, como será a convivência Mart vs FMF? Estamos a tomar as opções certas para o fim que pretendemos atingir? Sendo Mart o eleito, haverá espaço para este desenvolver um trabalho meritório integrado numa estrutura que, claramente, o repele?

Que caminhos?

terça-feira, 18 de maio de 2010

Eu Estou Apaixonado

Eu estou apaixonado, essa paixao é tão grande… Não havia outra forma de começar esta postagem que aparece, quase, um mês depois da última. Também não havia como fazer esta postagem surgir mais cedo do que surge.

Cá estamos: 2 anos depois do Xiguiane que oficializou a “entrega” da filha dos Mondlanes aos Mutisses, um mês depois que assumi um novo desafio e um mês depois da última postagem.

Estou apaixonado pela minha mulher. Não hajam dúvidas. Também sabendo o quão ariscado é andar fora não há outro meio se não renovar os laços a medida que o tempo passa. Próximo dia 18 de Maio serão 3 anos e assim sucessivamente.

A minha mulher é fantástica, deu me a Uly e a Lethícia, ajuda-me a manter o equilíbrio e a serenidade que me pode a ajudar a ser um bom pai (tento sempre ser) e um bom profissional onde quer que esteja.

Estou apaixonado pelo meu trabalho. Estou apaixonado pelos desafios que a Matola me apresenta. Estou apaixonado pela vontade e desejo de ver as coisas melhor do que as encontrei quando cá cheguei. Vontade de ter a Administração Municipal moderna quando de cá sair. Apaixonado pela vontade de contribuir, com meu saber, para o almejado Desenvolvimento Municipal da Matola que me acolhe e quer usufruir do meu trabalho e esforço; esforço que jurei dedicar. Só posso estar apaixonado.

A Matola é um desafio especial. Os problemas da Matola, conhecidos e desconhecidos, não podem ser dissociados dos problemas gerais deste país que luta por fazer a viragem e ser próspero. Não são problemas impossíveis de vencer. Como os problemas da Nação, requerem empenho, dedicação, entrega e muito saber. A equipa em funções procura dar isso. Foi do saber dos servidores municipais que nasceu o Plano de Estrutura Urbana recentemente aprovado que vai ser um instrumento de MUITO valor na gestão do solo urbano. Foi do saber dos que cá estavam e estão que nasceram muitas soluções aprovadas e por aprovar que constituirão uma mais valia para todos. Esse é o caminho,: conhecer os problemas para gerar soluções... um trabalho excitante e apaixonante.

Estou apaixonado pelas coisas que jurei abraçar para a minha satisfação: a minha mulher, meu trabalho, este blog e os meus amigos que me visitam aqui, em casa e me procuram naquele bar para uma cerveja nos momentos de laser.

Este blog é minha paixão. É assim que vejo este blog. Como diz Mapengo definindo paixão para ele aqui este blog é um momento da paixão “é a fase sofridamente bonita. O dizer organizadas frases bonitas mesmo sem sentido; compreender o silêncio da noite; apreciar o brilho prateado da lua; sentir o gostoso aroma das flores; sorrir das parvoíces da sua companheira e rezar para que o tempo não se esgote.” Hehehehe é isso. Ou quase isso. Os debates apaixonantes sofridamente bonitos; o desejo que não se esgotem etc.

Por tudo isso estou apaixonado. Sei que Mapengo vai me trucidar. É que ele tem dificuldades, de olhar para paixão como algo lúcido. Paixão tem sempre tendência a levar aos extremismos diz ele. É possível.

Não acho as paixões más. São até boas. São elas que fundam o amor. São a base em que assenta o amor (não acredito em amor à primeira vista) logo, a paixão é "criança", o amor é adulto... maduro e sereno. É na paixão que nos afirmamos, que corremos os riscos muitas vezes incalculados, que nos martirizamos inclusive. A paixão é necessária. Como o medo que nos ensina a moderar, a conhecer limites...

quinta-feira, 29 de abril de 2010

Se a Grécia Fosse um País Africano?

A Grécia está em crise.A Europa está preocupada. Multiplicam-se apoios detodos os quadrantes. Há que salvar os pobres gregos.
Só ainda não ouvi falar de uma palavra recorrente quando as crises cíclicas se abatem sobre nós.
Já li sobre professias de se Obama fosse africano. E se a Grécia fosse um país africano? O que diríamos da crise? Que nomes chamariamos aos seus dirigentes? Que razões apontaríamos para a crise?
Vamos lá adivinhar. Ou não é preciso?

quarta-feira, 14 de abril de 2010

Cadê a Auto-Estima?

Porque será que a nossa capacidade de nos indignarmos com as situações anómalas que acontecem no nosso quotidiano só se revela na plenitude e sugere a necessidade de acção quando as anomalias são mencionadas por estrangeiros ou no estrangeiro, seja por relatórios das “agências” internacionais ou panfletos de algum indignado? Porque é que a nossa capacidade de indignação é nula ou diminuta quando somos nós, donos da terra, a passar pelas situações anómalas que ocorrem um pouco por todo o lado?

A que propósito vem tudo isto? Vem a propósito do debate que corre sobre a actuação da nossa polícia num caso envolvendo turistas sul-africanos relatado aqui, que provocou a indignação de muitos companheiros que, validamente, sugeriram (partindo da situação relatada pelos turistas sul-africanos no link indicado) a necessidade de “as autoridades de Segurança Pública e do Turismo trabalharem em conjunto, senão ninguém volta a Moçambique” bem como a necessidade de “lançar uma discussão de como nos podemos organizar entanto que país para mudar essa imagem.”

A verdade é que as experiências relatadas pelos sul-africanos são o nosso dia a dia e nunca nos levantamos tão indignados como acontece desta vez. Eu próprio relatei as peripécias porque passo ao volante da minha viatura no mesmo fórum onde o “debate indignado” com a situação do sul-africano se levantou e o máximo que obtive foi solidariedade e conhecimento de quem, de entre os debatedores do fórum, conduz veículo similar. Nunca discutimos, de verdade, a actuação da nossa polícia e seus possíveis efeitos não só no turismo, mas em muitas outras esferas incluindo na mentalidade dos nossos filhos.

Bastou a “experiência assustadora” de um estrangeiro que nos indignamos.

Quem se preocupa com as experiências assustadoras às mãos da polícia que eu e muitos outros passam nesta cidade e neste país, muitas vezes relatadas e desvalorizadas nos mesmos fóruns onde se sobrevaloriza a “experiência assustadora” do estrangeiro? Cadê a auto-estima e a confiança nas nossas capacidades necessárias para vencer os desafios que se nos colocam a cada momento? Precisamos do estrangeiro até para constatar que a nossa polícia, em muitos casos, aborda mal e presta um mau serviço aos cidadãos moçambicanos e aos estrangeiros que nos visitam?

Fiquei a saber que uma viatura similar a que conduzo foi usada por bandidos numa das incursões espectaculares ocorridas em Março. Parece que a nossa polícia assumiu ou que a viatura “é criminosa” ou que quem a conduz é, até pelo simples facto de a conduzir, um bandido. Como me parece não haver articulação na actuação da polícia, já me habituei a ser revistado em três road blocks seguidos normalmente separados por não mais do que 5 KM.

Há dias regressava a casa depois de uma jornada de trabalho extremamente cansativa na companhia da família (esposa e filhas) e recebemos ordem para parar de um cinzentinho no posto existente após as bombas da fábrica Mac-Mahon no Jardim. Em pouco tempo o carro estava cercado por outros cinzentinhos, um agente da FIR e outro, presumo, da guarda fronteira. O Polícia de trânsito aproximou-se com o cinzentinho armado com a sua AK47, pediu os documentos do carro e meus, ordenou que todos abandonássemos o carro e, o cinzentinho armado com a sua AK47 em riste, bruscamente abriu a porta do passageiro ao lado do motorista e, acto contínuo, abriu a porta traseira de onde emergiram os outros ocupantes do carro: minhas filhas de 11 e 6 anos de idade.

O máximo que obtive após barafustar contra o modo como estávamos a ser tratados, principalmente na presença de crianças, foi um pedido de desculpas do PT estar em curso uma “caça” a um Mark II creme que é “usado em assaltos” e ordenou que a revista parasse.

Clarifico que a ideia não é a desconsideração das denuncias feitas por estrangeiros. O meu problema é que corremos a lançar uma histeria generalizada quando os estrangeiros se queixam de situações anómalas quando nós mesmos, vezes sem conta, somos humilhados e passamos pela mesma situação sem que façamos absolutamente NADA. Quantos concidadãos não sofreram de tudo mais um pouco nas mãos da nossa polícia simplesmente porque conduzem um determinado tipo de viatura?

É verdade que temos criminalidade, é verdade que temos o polícia mais despreparado etc., não precisamos é que venha seja lá quem for para nos mostrar que isso existe porque sabemos. Precisamos é agir e não levar e calar.