terça-feira, 18 de setembro de 2012

Interpelando o Poder

Interpelando o Poder

Júlio S. Mutisse

Julio.mutisse@gmail.com

Ideiassubversivas.blogspot.com

A propósito do retiro do Governo em Namaacha em Fevereiro de 2009 para uma reflexão sobre os "quatro anos de execução do plano quinquenal", publiquei no meu blog um texto no qual, entre outras coisas, questionava que reflexão fazíamos enquanto cidadãos sobre a mesma matéria, bem como sobre que contributo poderíamos dar para identificar os sucessos e os constrangimentos que ainda se apresentam e de que forma usamos os mecanismos ao dispor para fazermos chegar os nossos pontos de vista sobre as coisas que nos apoquentam.

Era meu entendimento nessa época (e continua sendo) que enquanto cidadãos devíamos estar permanentemente em reflexão; os efeitos das decisões governamentais reflectem-se sobre nós, razão porque há sempre necessidade de, em cada momento, questionar, interpelar os decisores públicos chamando-os a razão sobre as suas decisões. Agindo assim, parafraseando Josué Bila, seremos verdadeiramente cidadãos e não habitantes desta também designada pátria de heróis.

A propósito do debate ocorrido nesse espaço o Professor Elísio Macamo, interpelou-me referindo que uma dificuldade evidente, "reside no facto de que muitas vezes não está clara a posição a partir da qual interpelamos o exercício do poder." Segundo ele, "esta falta de clareza pode comprometer o que de útil temos a dizer. Por exemplo, numa perspectiva académica precisaríamos de identificar o que está em questão e trazer isso à atenção de todos os outros que se interessam por esse tipo de discussão. Numa perspectiva activista podemos simplesmente estar interessados em propor outras maneiras de fazer as coisas. Esta atitude, infelizmente, tem sido frequente e não ajuda, pois na maior parte das vezes não revela compreensão adequada do problema. Há também a necessidade de ver como grupos profissionais directamente afectados por coisas devem reagir ou posicionar-se." Macamo concluiu dizendo que "a sociedade é coisa tão diversa que a nossa crítica pode pecar por homogeneizar demasiado. No fundo, contudo, o desafio é de cidadania."

Esta interpelação levou-me a reflectir sobre os desafios que se nos colocam no diálogo que devemos empreender permanentemente com quem nos governa como cidadãos que somos. Como ele se processa? Como pode se efectivar? Que mecanismos devem ser criados? Como interpelar o poder? Que papel e postura devem assumir as organizações profissionais, sindicais, estudantis, juvenis etc., neste diálogo.

Ainda não construi uma resposta acabada mas, essencialmente, acho que a questão fundamental aqui em Moçambique como em outros cantos do mundo, é a falta de mecanismos reais e efectivos de comunicação entre governantes e governados para além das presidências abertas e a simples difusão de comunicados de imprensa preparadas para o consumo público. Faltam ou escasseiam canais efectivos de ligação entre nós enquanto cidadãos e aqueles a quem mandatamos que nos governem.

Estes canais não se criam por Decreto, resultam de processos históricos que ajudam a criar e manter mecanismos efectivos de responsabilização. Estes mecanismos para mim consistiriam numa estruturação da sociedade (a dita sociedade civil) numa diversidade de organizações verdadeiramente autónomas e dinâmicas que efectivamente interajam entre si e estejam em permanente contacto, concertação e negociação entre si e com o Governo.
Entrariam aqui, associações empresariais, associações profissionais, associações juvenis (as juventudes partidárias por exemplo, o CNJ, e outras) sindicatos, partidos políticos (sérios e responsáveis), clubes, associações locais a nível dos bairros etc. Se estes mecanismos forem criados e efectivados, a comunicação vai fluir e nisso ganharemos todos.

É que, para mim, um Governo que efectivamente se preste a responder perante o parlamento e perante sectores devidamente estruturados da sociedade, obriga-se a estar devidamente preparado para atender às pressões que possam sair ou daí possam advir e, ao mesmo tempo, cria em nós enquanto cidadãos e membros de algo organizado, a exigência de estarmos informados com responsabilidade de modo a dialogar com o Governo. Sublinho DIALOGAR e não fazer exigências como, me parece, é a tendência das ditas organizações existentes de momento.
Uma sociedade com capacidade de interpelar os seus dirigentes (afinal seus empregados) cresce; amadurece e aparece.