segunda-feira, 1 de novembro de 2010

Que Dizer de Nós? Ontem e Hoje...

Os últimos pronunciamentos de grandes figuras do Partido Frelimo levantam a mim questões relevantes que devem merecer uma aabordagem crítica desapaixonada.

O nosso camarada Jorge Rebelo veio a público e "partiu a loiça" como se diz por aí, com críticas das quais nem AEG, ele próprio, escapou (afinal o "não corrupto" Dr. Ivo Garrido foi "corrido" por Guebas).

Estes pronunciamentos tiveram eco em determinada imprensa que não se coibiu de colorir as primeiras páginas com título parangonosos de aplauso a "rebeldia" interna deste destacado militante da Frelimo.

Se por um lado aplaudo o exercício democrático de, livremente, expressarmos as nossas opiniões, custa-me um pouco olhar para as comparações, reais ou aparentes, com o passado.

A abertura que se experimentou teve muitas vantagens económicas e sociais. Desde logo, a circulação mais livre de pessoas, maior oferta de bens e serviços no mercado, maior crescimento económico, maior abertura no debate de ideias, etc.
Nestes termos me parece falta de honestidade intelectual e política quando se comparam os níveis de criminalidade e de corrupção entre tempos do socialismo e os tempos actuais.
Nos tempos do socialismo todos vivíamos mal, com as bichas, com as carências de todo o tipo. A sociedade era fechada, com a actuação omnipresente dos Chefes de Quarteirão, dos milicianos e de todo o género de autoridade. A atmosfera de vigilância e denúncias mútuas, que o Departamento do Trabalho Ideológico incentivava submergia qualquer iniciativa, quer positiva, quer negativa.
A abertura económica e o consequente aumento da competição entre os indivíduos têm, necessariamente, que trazer novos desafios nestas matérias. Ouso dizer que, mesmo Samora, se fosse vivo nos dias de hoje, teria que enfrentar maior criminalidade e corrupção, fenómenos que, a meu ver, independem da personalidade e perfil de Samora tendo, isso sim, a ver com o relaxamento da pressão colectivista da sociedade e mais incentivos à iniciativa e promoção do individuo. Tem a ver com a eliminação dos controles que um dia tivemos com os chefes das 10 casas, chefes de quarteirão, milicianos e outros agentes omnipresentes no modelo de ontem competentemente chefiado pelo Camarada Jorge Rebelo propugnava com denodo. Já diz meu amigo PC Mapengo num texto lindo intitulado "Manifesto Político" “Saudades sim mas ninguém quer voltar porque não podemos esquecer o tempo que passou... eram bons tempos aqueles que ninguém quer mais voltar.”

30 comentários:

V. Dias disse...

Caro Mutisse,

Primeiro agradecia que me explicasses o significado de AEG.

Estou desligado de correntes ou correias que ligam movimentos associativos do partido Frelimo e/ou do Governo. Por isso não estranhe esta ignorância que, para mim, é um ousio saber.

Quanto ao teu texto, o que tenho a dizer é que: não se pode prever o que seria Moçambique com Samora. Isto é serviço dos bruxos, mas duma coisa tenho eu a certeza: a maioria desses 'tiriricas' que andam por aí hoje, feitos deuses, estariam na cadeira, presos. O povo, não estaria a gatinhar tanto de humilhação.

Zicomo

Nelson disse...

V.Dias, AEG tem significado Armando Emílio Guebuza.
Eu tenho dificuldades é em entender porque se coloca tanto peso no que Rebelo disse a ponto de ser grande manchetes e até temas de postagem como se oque ele disse fosse ao todo uma grande novidade. Nos copos, nas baracas, nos chapas já se ouvia oque Rebelo disse embro provavelemente dito de várias maneiras.
Eu não confio no género humano e isso tem relação com minha sólida educação cristã. Nada me garante que Samora não se corromperia como oresto da "malta". Mudam-se os tempos, mudam-se as vontades. Eu não sou bruxo por isso não posso prever como as coisas seria com Samora e nem posso prever que seriam bem melhor pois dá tudo no mesmo.

Anônimo disse...

Caro Viriato/Nelson, uma coisa é conversa de barraca, outra é ouvir um dirigente de topo a falar. Eu posso tolerar que um vizinho, na barraca da esquina que também frquento, diga que se Samora estivesse vivo não haveria corrupção.

Mas já concordo com Júlio Mutisse quando acha estranho que pessoas como Graça ou como Rebelo reproduzam o mesmo discurso. Da parte deles isso é demagogia e é populismo porque sabem que corrupção não depende de pessoas. Depende de contextos. Esses novos "críticos" deviam dizer que no tempo de Samora havia GVP's (Grupos de Vigilância Popular) e hoje não existem. No tempo de Samora vizinho vigiava e denunciava vizinho, filho vigiava e denunciava o pai (com forte incentivo e ensinamento de Jorge Rebelo) e hoje essas práticas são fortemente reprovadas. Ora, esses instrumentos repressivos omnipresentes "controlavam" a criminalidade e a corrupção.

Regimes fechados e repressivos costumam ter baixos níveis de criminalidade e de corrupção.

Custa-nos muito, também, ouvir Jorge Rebelo a transformar-se hoje em campeão do espírito crítico. O maior responsável do pensamento unánime no nosso país é precisamente Jorge Rebelo. Ele era o guardião da "pureza" das ideias revolucionárias no Partido e no país. Seria bom imaginarmos o que aconteceria, nos tempos em que este senhor controlava a ideologia, se um jornalista mostrasse espírito crítico!

Jovens estudantes que tentaram mostrar espírito crítico nos tempos de Rebelo/Graça machel foram parar aos campos de reeducação (lembro-me dos jornalistas António Elias - já falecido -, Tembe, a viver na França, de Amadeu Reane Augusto, do docente universitário Doho, de Mabota). Todos estes, por terem querido ser estudantes críticos, foram parar à reeducação.

Eu, se fosse eles, teria um pouco de vergonha de levantar certas matérias. Afinal nem todos os moçambicanos são amnésicos.

Julião vembane

Julio Mutisse disse...

Caro Viriato, creio que o Juliao Vembane ajudou me a responder a parte do que dizes. Agradeco que contextualize a governacao samoriana e o que se seguiu nos finais dos anos 80 que culminou com a Constituicao de 1990 e subsequentes.

Relembro que se tem dito que a Renamo lutou para por fim ao trabalho dos grupos dinamizadores, milicianos etc que "eram opressivos." A conjuntura em que vivemos a partir do periodo que lhe enuncio acima, tratou de transformar essas estruturas em irrelevantes a tal ponto que eh possivel viver 10 anos no mesmo predio com um ladrao sem o saberes coisa que era impossivel ha 20 anos.

O fim dessas estruturas propiciou MUITAS coisas. O primado das liberdades individuais e o fim da pressao colectivista da sociedade empurou nos para a competicao com todo o potencial de "batota" (leia-se corrupcao) com ela inerente, coisas que, naquele contexto samoriano eram impossiveis por tudo o que se disse.

Portanto, nao eh ser bruxo ou similar dizer que, com o regime actual, mesmo que Samora fosse vivo enfrentariamos os mesmos problemas.

A China esta paulatinamente a abrir-se e ja ouvimos casos de corrupcao. O numero 1 do Partido em Xangai foi obrigado a demitir-se por causa de um escandalo que abalou a sua credibilidade ligado a gestao de um fundo de pensoes. Estamos a falar da China Viriato que esta a abrir-se de onde comecam a aparecer este tipo de coisas proprias de paises menos vigilantes, digamos, com os seus.

Por isso, sem referencia a diferenca de contextos em que dizemos determinadas coisas, julgo inusitado vir aqui evocar o tempo de Samora, ate por tudo o que Juliao disse acima sobre as figuras em causa.

Julio Mutisse disse...

Nelson, o pais nao pode se reproduzir com base no senso comum superficialissimo.

Todos os dias ouvimos, no chapa, no dumba nengue coisas que, se pelo menos nos bafejados pela sorte de ter formacao e informacao nos darmos ao trabalho de reflectir sobre elas podemos chegar a outras conclusoes ou ajudar a formar melhor tal opiniao com base em premissas correctas.

Todos dizem que no tempo de Samora... ou se Samora fosse vivo isto e aquilo nao seria possivel. Esquecemos de dizer em que contexto eh que se reproduziu a governacao de Samora, toda a conjuntura inerente ao control que a Sociedade fazia aos seus membros. Coisas que nao existem hoje em dia.

As mudancas que experimentamos nos finais dos 80 inicio dos 90, reza a historia, iniciaram com o proprio Samora. Nao seria possivel a meu ver mudar a sociedade sem que o homem mudasse. Ele enfrentaria estes problemas que sao proprios de sociedades que vivem os desafios que vivemos e que pretendem construir uma sociedade em que o individuo assume as redeas do seu destino sem o controle excessivo da sociedade como acontecia no regime socialista liderado por Samora, Rebelo e outros.

Juliao,

Obrigado. Volte sempre

Anônimo disse...

De resto, não me lembro de ter visto ou ouvido Jorge Rebelo a exercer o senso crítico, que hoje apregoa, quando ele era mais jovem no tempo de Samora. E, naquela altura, como hoje, havia muitíssima coisa para criticar. Pode ser que, naquele tempo, era compensador para Jorge Rebelo ser lambebotas.

Era compensador porque as benesses de que gozava eram diferentes do sofrimento do povo. Às vezes romanceamos o tempo de Samora. Havia desigualdades também naquele tempo. GRITANTES! Nem todos viviámos na zona da cancela! nem todos tínhamos viaturas para transporte pessoal! Nem todos gozávamos férias no estrangeiro! Nem todos tínhamos loja para dirigentes!

Nelson disse...

Cada mal e cada bem no seu tempo. As coisas boas que hoje temos não sãao menos boas por causa das boas que tivemos em outros tempos; assim como os males de hoje não são menos males por causa dos do tempo de Samora. Compatriotas seja lá quem Rebelo for, para mim oque ele diz é apenas sua opinião( ele tem direito de ter uma por mais destorcida e incoerente que seja), pode ser seu "desabafo" por isso comparei às conversas que a gente ouve por ai. Se pedissemos para provar oque diz, certamente não o faria.
O maior problema não está simplesmente no que Rebelo diz(já antes foi dito) mas na relação que existe entre Rebelo e a Frelimo e sobre essa relação volto depois.

Julio Mutisse disse...

Nelson,

Eh mesmo por isso que digo que meu país é um exemplo de democracia e liberdade de expressão. Mesmo aqueles que negam esses dois princípios, de alguma forma, se beneficiam deles. Usam-nos. Interpelam, difundem e exprimem as suas ideias sem “algemas nas palavras” usando emprestadas as palavras de alguém.

As declarações recentes de Jorge Rebelo são demonstrativas disso mesmo. Haverá outra forma de analisá-las? Aquela eh a opiniao dele.

Nasci com Samora no poder. A minha primeira decada de vida foi com Samora no poder. Admiro e admirarei sempre aquele homem, pelo seu carisma, vitalidade etc. Houve coisas boas naqueles tempos coisas que devemos celebrar. Nao devemos, porem, esquecer o contexto em que tais coisas aconteceram. Foram tao boas que se as quisessemos replicar teriamos que fazer as necessarias adaptacoes e, se calhar, as disvirtuavamos o tiravamos a essencia. Tao boas que eram possoveis naquele tempo e hoje sao impensaveis... imagina o controlo do grupo dinamizador, miliciano, vizinho etc. Hoje achariamos violacao de privacidade com toda a panoplia de accoes juridico legais que se seguiriam.

Espero o seu discurso sobre a relação que existe entre Rebelo e a Frelimo. Eh essencial. Jorge Rebelo nao eh um militante qualquer. Faz parte da nata de mocambicanos que, no contexto dos primeiros anos da independencia tornaram possivel um Estado com um sistema politico diverso do actual, no qual esta interpelacao pura e simples ao discurso de um quadro senior do Partido Frelimo seria impossivel onde, pelpo contrario, deveriamos dizer YES ao camarada, yes que hoje ele nega ate a pessoas que se fizeram homens ideologicamente preparados apenas para dizer YES ensindos por ele proprio.

Acho que ha incoerencia.

V. Dias disse...

Obrigado Nelson pelo esclarecimento da sigla AEG.Pensei que fosse outra coisa, mais uma daquelas ONGs diarréicas. Disso temos a mais.

Em relação aos pronunciamentos de Rebelo, a menos têm quem os diga à luz do dia. Ao contrário de muitos (hossanas) que andam por aí, seguem às cegas a oração dos deuses da Frelimo. É preciso ter qualquer coisa nos calções para desafiar a Frelimo e, neste contexto, Rebelo tem estado bem.

Conheço Rebelo, já estive frente-a-frente com ele meia-dúzia de vezes, conversámos bastante, li-o, compreendo-o, portanto, é um homem de convicções fortes. Não é um daqueles que dispara sem argumentos.

Digam o que disserem, penso que com Samora o país não estaria com esta hemorragia toda sobre a máquina administrativa. A corrupção não pára, os nados-mortos continuam a multiplicar-se, enfim, o país está refém de valores. Valores meus senhores, hoje esta palavra não existe.

Eu contextualizo Samora numa perspectiva em que o mundo estava de pernas para o ar, era preciso impor medidas drásticas. Ora as medidas de Samora, na sua generalidade, foram boas e precisas. Portanto, mais vale 1 ditador do que 1000 corruptos.

Zicomo

Nelson disse...

Ok estou de volta!
É um facto irrefutável, que Rebelo seja membro sénior da Frelimo mas ainda tenho dificuldades em concordar/defender que por isso as suas declarações mereçam um tratamento especial.
Que em Moçambique haja problemas de corrupção ou mã governação, enriquecimento ilícito, pode ser dito por seja lá quem for e trata-se de uma opnião e não muda nada se for apenas para falar. Seja dito na rádio na TVM, seja dito por Dhlakama, Rebelo. Há que fazer mais do que isso(andar a falar por ai) que falar por ai como eu disse num dos comments, já muitos fazem nas conversas dos copos, nas baracas, nos chapas. Pelo facto de Rebelo ser “camarada” dos camaradas a quem acusa exige-se muito mais ainda, que faça muito mais do que simplesmente falar.
Não digo oque digo como que a defender que as coisas estejam bem como estão hoje ou a discordar com os que defendem Rebelo, mas não temos como voltar ao tempo de Samora sem nos submetermos à uma série de mudanças impossíveis. E se podéssemos não teríamos como voltar só nos aspectos “bonitos” da sua governação. Teriamos que ficar com o “kit completo” que como já aqui foi dito, incluiria o controlo do GVP, miliciano, vizinho, os campos de reeducação, operação e produção aldeias comunais e todo resto que fingimos esquecer para defender as coisas boas do tempo de Samora.
Rebelo tem espaço dentro do partido Frelimo(não sei se ainda tem) para abordar essas questões de forma mais produtivas, chamar os camaradas à razão, procurar produzir uma mudança interna em vez de fazer coro às lamentações do povo como se de um coitado ele se tratasse.

Nelson disse...

"mais vale 1 ditador do que 1000 corruptos"

V.Dias, tenho muitas dificuldades em concordar com essa mas também não preciso concordar.
A corrupção é tão nociva quanto a ditadura, para mim são dois males desnecessários.

Anônimo disse...

Caro Nelson, sinto que concordo contigo. Se quisermos recuperar todas as coisas "bonitas" do tempo de Samora, temos que estar preparados para que essas coisas voltem com o que as tornava possível. Se quisermos voltar aos baixos níveis de corrupção da primeira década da independência temos também que "recuperar":
(i) as lojas do povo, que nos tornavam todos iguais na bicha (quando começam as diferenças, começa também a crescer a ambição individual);
(ii) a propriedade colectiva sobre os meios de produção, sobre as empresas (quando permitimos que quem quiser tenha a sua empresas, trabalhe e enriqueça individualmente, hão-de necessariamente aparecer as diferenças de classe, a ambição individual há-de, em alguns casos, conduzir ao crime e à corrupção)
(iii) O SNASP, os GVP's, a Vigilância Popular, os milicianos, os Chefes das 10 casas, as chambocadas...

Parece que Viriato Dias quer voltar a isso. Alguém mais gastaria de acompanha-lo.

Mais acima, alguém disse que se romancea muito o tempo de Samora. É verdade que tinhas muitas coisas bonitas. Eu próprio beneficiei imenso com as medidas Samorianas. Tenho uma grande admiração por esse homem.

No entanto, esse tempo tinha muitas coisas más que o senhor Rebelo não as refere. Eram tão más que tivemos que fazer mudanças de que quase todos nós (com a excepção de Viriato) estamos gratos.

Rebelo, Graça e Marcelino devem contextualizar as suas bombásticas afirmações. E devem substancia-las. De outro modo é demagogia, populismo, arruaça e agitação barata.

As coisas más que existem hoje no nosso país devem ser abordadas com responsabilidade e com os pés assentes na terra. É utópico pensarmos que voltaremos a ter, no contexto das liberdades individuais de hoje, os níveis de criminalidade e de corrupção do tempo de Samora.

Julião Vembane

Reflectindo disse...

Estou concordando com alguns aqui, aliás, já há semanas disparei isso noutro lado... há sinais de quem não gostou.

Quem aplaude as críticas do trio sobretudo quando subeleva o tempo Samoriano tem que ser capaz de criticá-lo também. Eu tento fazer isso. Samora teve o seu lado bom, mas também o seu lado mau. Por outro, acredito muito que para o seu lado mau, Samora foi manipulado por alguns que estão vivos. Ainda, estes três não são inocentes das guerras, primeiro dentro da Frelimo como Frente de Libertacão nos finais dos anos 60, depois no período pós-independência. Há testemunhas em vida.

Eu acredito que os problemas actuais podemos enfrentá-los sem necessariamente derramar-se sangue equivalente ao derramado devido aos problemas criados pelos revolucionários. Por essa razão acho que é o nosso dever em não aceitarmos o lancamento de qualquer destes para fazer voltar o país ao estado dos finais de 75 princípios de 80.

Amigo Mutisse, porque os países menos corruptos são os mais desenvolvidos e mais abertos (democracia e liberdade de expressão), não acredito que os níveis da corrupcão no nosso país se devam necessariamente ao desenvolvimento e abertura.

Mas uma coisa talvez muito necessária, é procurarmos saber se a corrupcão de facto comecou com a morte de Samora. E se nos primeiros anos da independência não houve corrupcão notável, dependeu apenas de quem governou ou haviam outras razões? No último relatório coloca Somália e Afeganestão como os países mais corruptos. Os dois países estão em guerras prolongadas. Então, não pode ser que a corrupcão em Mocambique teve a guerra civil como o seu fertilizante? Apenas uma reflexão.

Nota: hoje em dia, é fácil falar mal da corrupcão para se tornar popular, mas na prática?

Julio Mutisse disse...

Ilustres,

Este debate esta interessante.

Reza a história que a Constituição da República de 1990 foi dos marcos mais importantes da viragem até ao estagio em que no encontramos de profunda abertura politico democrática, económica e social. Foi a partir daí que ficaram consagradas as liberdades de opinião, expressão de imprensa etc que, inclusive, propiciaram o cogumelado de jornais, revistas e outros meios que hoje, aqui, veiculam informação. São coisas aplaudidas, que todos gostamos de gozar e usufruir. Antes desse advento, o Camarada Rebelo tinha sido um dos mais destacados dirigentes; dos principais ícones de uma ideologia diversa da actual, em que tais liberdades celebradas eram praticamente impensáveis.

Podem ter sido gloriosos, esses tempos, mas o país mudou. Sem embargo das crenças igualitaristas de alguns, o país avançou por um irreversível processo de liberalização económica. Este processo, sendo contrário ao modelo que o Departamento do Trabalho Ideológico propugnava (com as suas bichas, com as suas graves carências alimentares, com as roupas uniformizadas que a crise nos obrigava a usar) libertou a iniciativa empreendedora das pessoas. Os mais trabalhadores, os mais audazes, vão necessariamente viver melhor do que os chorões e preguiçosos. E nisto, o país não está a inventar nenhuma roda. Foi deste mesmo modo que foram construídas as economias de sucesso que hoje admiramos. Suécia, Canadá, Dinamarca, Noruega, Estados Unidos da América, Espanha, França… Nos fundamentos destes Estados pôs-se claramente de lado qualquer veleidade igualitarista. Pelo contrário, os sistemas colectivistas, como o que o Departamento do Trabalho Ideológico defendia para o nosso país, sucumbiram e esfarelaram-se todos. Resta a Corea do Norte para exemplo!

Ironicamente é essa abertura política que felizmente produz também ricos que permitiu o surgimento de jornais privados/independentes, o surgimento do Parlamento Juvenil cujos líderes não se sustentariam nos tempos em que o Camarada Rebelo detinha poder. Foi essa abertura (que o meu Camarada parece abominar) que permitiu a abertura de todos os espaços que hoje lhe aplaudem efusivamente (de jornais privados a blogs).

Portanto, Viriato meu caro. Creio que, mais uma vez, o Nelson e o Vembane te responderam a contento. Escuso me de voltar a tocar no assunto.

Reflectindo,

No criterio de corrupcao que tem sido achacado aos nossos paises e que legitima o sistema de ajuda que temos, provavelmente possas ter razao quando dizes que "os países menos corruptos são os mais desenvolvidos e mais abertos (democracia e liberdade de expressão)" eu tambem não acreditaria que me dissesse que sao. Com que legitimidade viriam aqui dizer nos que somos corruptos a ponto de se darem ao luxo de fazerem o que fazem. Seria incoerencia nao acha?

Defendo que o que chamamos de corrupcão no nosso país eh resultado de medidas que a determinado tempo mudaram a nossa forma de estar, consubstanciadas na abertura e valorizacao pessoal do individuo; o afrouxamento da repressao da sociedade sobre o individuo (em prol de ideais igualitaristas) que o permitem tomar iniciativas que o destacam dos demais, criando valor para si e para os seus, criando, igualmente, diferencas que o tempo anterior nao propiciava e como ainda nao nos libertamos desse tempo, todo o que se destaca eh porque eh corrupto hehehehe.

Anônimo disse...

caro Reflectindo, fez uma análise que a subscrevo em 90%. Principalmente quando diz "hoje em dia, é fácil falar mal da corrupcão para se tornar popular, mas na prática?". Há um aspecto, no entanto, que carece de ser debatido: A diferença entre os níveis de corrupção entre países como o nosso e os países desenvolvidos.

Caro Reflectindo, a razão da diferença é, na minha opinião exactamente essa: É porque uns são desenvolvidos e outros são subdesenvolvidos.

Quase todos os países tiveram, numa determinada fase do seu desenvolvimento, elevados níveis de corrupção. Este facto tem a ver com o desenvolvimento das instituições desses países. Quando as instituições são boas, a corrupção baixa. Quando as instituições são fracas (como é o nosso caso) a corrupção sobe.

Não precisamos de recuar muito tempo. Há menos de 100/150 anos atrás, os Estados Unidos viveram fenómenos que indiciavam um fraco desenvolvimento das instituições do Estado:
(i) A Marcha para o "Far West" foi feita a pulso, com muita justiça pelas próprias mãos, com Xerifes e autoridades civis fraquíssimas (isso está abundantemente registado, até em literatura)
(ii)Os níveis de corrupção nos Estados Unidos eram elevadíssimos na primeira metade de século XX. o florescimento do contrabando, o domínio das máfias - o Padrinho -, a adjudicação de obras públicas com base em esquemas (tudo isto está extensivamente documentado)
(iii) O poder de organizações como o KKK, que prevaleceu até à segunda metade do século XX.

No entanto, à medidas em que os USA se iam transformando numa grande potência, as suas instituições se iam fortificando, começaram a controlar o fenómeno da corrupção. Hoje, quando alguns lêm os relatórios do Departamento de Estado sobre corrupção e/ou sobre Direitos Humanos, pensam que os USA sempre foram campeões nesses aspectos.

Se formos a estudar a trajectória de todos os países, hoje desenvolvidos, vamos encontrar que também passaram por fenómenos similares aos que nos afectam (por exemplo, quem ouve os europeus a criticarem o trabalho infantil fica com a impressão de que eles sempre respeitaram as criancinhas. Até à primeira metade do século XX crianças com menos de 12 anos trabalhavam mais de 12 horas nas diversas manufacturas que então existiam na Europa, com destaque para a indústria téxtil)

Os problemas de corrupção têm a ver sim com a paz, com a abertura política e económica, com o desenvolvimento, com instituições sólidas (que só podem existir em países com solidez económica.)

É falso quando alguns nos Vêm dizer que são desenvolvidos porque não têm corrupção. Na verdade, o que é verdade é: Não têm corrupção porque são desenvolvidos

Julião Vembane

V. Dias disse...

"É verdade que tinhas muitas coisas bonitas. Eu próprio beneficiei imenso com as medidas Samorianas. Tenho uma grande admiração por esse homem." Vembane

Então, ilustre Vembane, não se está a queixar com a pança cheia? Este não é caso de estatística para, no meu franco entedender, concluir as políticas de Samora não só beneficiaram a si, caro Vembane, mas também o povo de que, aliás, ele tanto amava. O País inteiro colheu louros.

E vão me dizer "este gajo está louco. Então, houve a operação produção, 'chambocadas' para aqui 'chambocadas' para ali, milicianos aqui e acolá". Sim, houve tudo isto e mais alguma coisa, e porquê?

É neste aspecto que convido os meus pare, a par dos seus cursos/formações académicas ou actividades profissionais, a se formarem em História.Esta permite, além do mais, compreender os factos e os homens ao longo dos tempos.

Samora aparece num período conturbado da História Mundial, numa altura de crispação entre as grandes potências mundiais. É preciso não esquecer nunca que a situação geoestratégica de Moçambique condicionou o país a entrar, indirectamente, nessa guerra de gigante! Não vou aqui falar da Renamo, etc., até porque tenciono constar estes dados numa obra que estou a coordenar com os investigadores da minha universidade.

Diga-me lá, caro Vembane, qual teria sido a posição de Samora face à esta instabilidade conjuntural e mundial. E qual o país africano, na situação de Moçambique, escapou a esta onda? Tinhas a região toda a 'arder de fogo' e era, digo eu, indubitável que tal situação acontecesse. É pena que não se pode recuar a história, é pena...

Aprendi e continuo aprendendo na Academia da História que " a política não se faz de uma maneira linear. Todos os países sabem o que são as contigências conjunturais." Samora compreendeu isso, tanto é que, à semelhança de Salazar, por exemplo, durou algum tempo.

E ainda: As Relações Internacionais aprendi com os meus docentes que elas não são mais do que a guerra pela defesa de territórios, assim acontece também com os animais irracionais. Quem disser o contrário mente. Portanto, isso para lhe dizer o quê? Que para o contexto mundial de então, a figura de Samora Machel foi uma benção para Moçambique e seria, presumo eu, nos tempos actuais, e porquê?

Porque para Samora o povo era o verdadeiro petróleo de Moçambique. Eu confesso: não sou democrata e nem tenho nada de democrata mas, verdade seja dita, caro Nelso, mais vale ter um ditador a reinar suavemente do que orangotangos corruptos que lixam o país. Basta ver como é que o nosso País está a ser governando.

Como queres que isto mude? Pensas que mudará algum dia, sem homens com tomates nas calças (passa expressão) para virar a lona? Nos próximos 500 anos vamos viver assim: a entregar o traseiro aos doadores, a ver a nossa economia a ser delapidada pelos Libertadores, a ver a moral escangalhada. Repare uma coisa, Mutisse: morreram 19 pessoas em Nampula vítima de acidente de viação, por acaso ouvi o governo a decretar luto nacional? É este o valor da democracia. As coisas valem pelo bolso e mais nada.

Zicomo

V. Dias disse...

E porque é que a sociedade moçambicana faz eco as declarações de Rebelo?

Justamente porque reconhecem nele uma certa imparcialidade. Rebelo é coerente, não tem receio de nada, mesmo para assumir que censurou...

Há entrevistas dele publicadas no Savana, etc. Ele diz, sem rodeios e onde quer que seja, que a Frelimo actual é contrária as orientações partidárias de base, ou seja, de Mondlane, de Machel. E não pode ser mais explicito.

Um homem assim, vale por dois. Eu aprecio Rebelo por essa frontalidade. Mesmo sem me conhecer à partida, confesso publicamente, lamentou o percurso actual do País. Reconheceu que algo vai mal e muito mal. Dí-lo isso também na imprensa, etc.

Agora, façam a mesma pergunta a Chissano, a Matsinhe (conheço por péssimas razões) a Sérgio Viera, se terão a mesma resposta? Voltando à meada, Samora foi sim um pecador justo.

Para terminar, permito-me uma pergunta: é este sistema que serem? É esta democracia que querem? Então que me digam qual é o sistema democrático que prosperou sem chupar sangue ao próximo? Qual é o sistema democrático, SENHORES, que progride sem matar, expropriar, roubar, etc., ao próximo? Ainda se fosse o seu povo, não. É sempre o vizinho. Terão como exemplo os EUA? Se sim, me CALO DE VEZ.

Zicomo

Anônimo disse...

caro júlio, de novo os meus parabéns pela oportunidade da discussão que incentivas com este texto. os meus parabéns vão também para o nelson pelo seu apelo para que a crítica vá para além de dar eco às lamentações do povo. esta tem sido também a minha insistência nos apelos que tenho feito em relação à maneira como poderíamos abordar o país com utilidade. é bom constatar que há mais gente que vê as coisas desta maneira.
o que gostaria mesmo de comentar é a excelente observação feita pelo julião vembane sobre a relação entre desenvolvimento e corrupção. a corrupção tem sido outro dos nossos mal entendidos. gostaria de deixar dois reparos para mais reflexão. julius nyerere foi dos dirigentes mais íntegros que já passaram pelo continente africano; suharto (da indonésia) foi um dos mais corruptos que passou pela ásia. aliás, à data da sua morte estava a braços com um processo criminal que o acusava de ter roubado mais de 500 milhões usd. o sistema que ele montou estava todo ele baseado na corrupção, mas, ao que parece, fez da indonésia um país próspero enquanto que o sistema de nyerere deixou a tanzania ainda mais pobre. com isto não quero dizer que a corrupção é condição de desenvolvimento, pois interveem outros factores que infelizmente não são suficientemente equacionados nas análises feitas. o que quero dizer é que a relação corrupção-desenvolvimento não é assim tão clara como muitos supomos.
o segundo reparo diz respeito ao quotidiano na europa, em particular, e no mundo desenvolvido duma forma geral. se não houvesse corrupção nestes países (estou a dramatizar) não sei se a máquina económica e política funcionariam bem. quem quiser comprovar isto só precisa de lançar uma olhada ao sector de construção civil em qualquer país. e não só. ao contrário do que muitos de nós pensam, afinidades políticas, regionais e interesses materiais desempenham um papel preponderante na adjudicação de contractos. a "transparência" pode ser representada. no sector académico - que é a realidade que conheço melhor - não são sempre critérios de qualidade que determinam que este projecto (e não aquele) sejam financiados; não são só critérios de qualidade que determinam que este candidato seja escolhido e não aquele. a diferença, e é bom enfatizar isto (aliás, um aspecto que já machado da graça numa discussão noutro fórum há vários anos havia destacado) é que aqui os casos conhecidos de corrupção são legalmente seguidos. mas reparem: não são todos os casos de corrupção que vão parar à justiça e o facto de haver regularmente processos devia ser indicação suficiente de que estamos, talvez, perante a ponta do iceberg.
nenhum destes reparos justifica que alguém se aproprie do erário público. mas só andar a repetir que corrupção é um problema também não ajuda muito.
abraços
elísio macamo

Reflectindo disse...

Caro Julião Vembane

Caro Julião Vembane, com certeza dizer que existe um país sem corupção seria mentira, o que se pode dizer é comparar o nível de corrupção, dizendo menos e ou mais corrupto.

Também seria mentir dizer que um país menos corrupto sempre assim foi. A redução da corrupção como qualquer mal duma sociedade é uma conquista, e, de facto, é desenvolvendo e fortalecendo as instituições que é possível reduzir. E o combate é constante. Nas últimas semanas, incluindo hoje, por exemplo, já acompanhei o quetionamento pela imprensa e imediatamente averiguado por uma comissão, de dois políticos suecos sobre umas "pequenas" ofertas (bilhetes) que tiveram de umas empresas.

“Os problemas de corrupção têm a ver sim com a paz, com a abertura política e económica, com o desenvolvimento, com instituições sólidas (que só podem existir em países com solidez económica.)”: Julião Vembane. Assino por baixo.

Do resto, estou de acordo que o caminho é para frente.

Anônimo disse...

Não sei o que dizer destas intervenções de qualidade que honraram este espaço que Júlio nos oferece. Está de parabéns Moçambique pelo facto de, em 35 anos, ter produzidos estes Júlios, estes Nelsons, estes Reflectindos, estes Elísios. A nossa simples presença, com qualidade, nos espaços públicos de debate é uma demonstração de que, embora tenhamos ainda um longo caminho a percorrer e embora os vários erros, somos um Estado viável.

Quanto às posições de Viriato apenas dizer que, embora o espanto que me causam, é seu direito amar as ditaduras. no mundo há toda a espécie de pessoas. Só posso tentar compreender.

Os conhecimentos históricos não se adquirem apenas nas faculdades de história. A cultura geral ajuda a equipar qualquer um com os conhecimentos necessários para participar na troca de ideias. Aliás, os comentários que fiz sobre a conquista do extremo ocidente, sobre o KKK, sobre a corrupção nos USA e na Europa mostram que estou minimamente equipado com conhecimentos históricos para poder desenrascar.

As únicas observações a fazer em relação aos conhecimentos históricos de Viriato são as seguintes:
(i) Se eles servem para justificar as coisas terríveis que Jorge Rebelo fez no passado, deveriam também ser capazes de compreender que a corrupção que nos afecta hoje é "um momento histórico" que se enquadra num contexto específico;
(ii) Se os conhecimentos históricos de Viriato servem para justificar os fusilamentos sumários (que Jorge Rebelo cantou ou mandou cantar) deveriam servir também para comprrender que a nossa pobreza, os índices que são regularmente publicados e que nos envergonham têm relação com o trâfeco de escravos, com o colonialismo, com as regras comerciais injustas... E não com desígnios maléficos de quem quer que seja;
(iii) Ou seja, Viriato não deve usar os seus conhecimentos históricos de forma enviesada para apenas justificar as atrocidades do seu heroi Jorge Rebelo e guarda-los na gaveta da memória quando se trata de analizar outros fenómenos políticos e sociais. Ou guarda-los na gaveta quando se trata de acometer contra os que considera adversários políticos ou ideológicos.

De resto, acho que é seu direito amar os campos de reeducação, amar e defender os fusilamentos sumários, amar e defender as ditaduras deste mundo.

Julião Vembane

Julio Mutisse disse...

Estou a adorar este debate por varias razoes. Uma das quais eh, mais uma vez, constatar que em alguma coisa podemos concordar com pessoas com as quais discordamos em MUITA coisa. Nao eh assim brother Reflectindo?

Outra razao eh constatar a incoerencia e contradicoes das pessoas. Veja-se o caso do Viriato Dias no que tange aos seus posicionamentos noutros debates sobre o passado e presente de Mocambique. Eh sintomatico.

Mais uma razao eh descobrir que nao ha temas tabus. Pode ser que alguem duvidasse da possibilidade de discutirmos pronunciamentos de um camarada daquele calibre nestes espacos. Mas ca estamos a debater ate a exaustao os nossos posicionamentos em relacao a posicao do camarada Rebelo.

Uma posicao que acho problematica. De todo.

Temos que fugir aos aplausos e abordar as questoes de forma sabia e contextualizada possivel. O tema corrupcao da azo a palmas mas, muitas vezes, o temos abordado de forma irresponsavel e, inclusive, a queimar-mo-nos uns aos outros e ate a minar a confianca que as pessoas devem ter com as instituicoes e com as pessoas que as dirigem.

V. Dias disse...

Quando nao sou capaz de ser compreendido, regra geral, retiro-me. Felizmente, o tempo que é o maior professor e mestre, acabará por me dar razão, como se eu fosse, parafraseando Arrone Fijamo, a bússola certeira, o que não sou.

1. Nao disse em momento algum que os meus pares (vos) deveriam seguir às minhas pegadas. Este espaço, até onde sei, não é uma igreja ou uma mesquita. Também ficaria mal, da minha parte, se assim estivesse a acontecer.

Disse e ressalvo, que era bom que algumas pessoas se esforçassem em aprender a história para, juntamente com as suas formações, tirar partido do passado de forma desapaixonada. Também disse que Rebelo nao é nenhum santo, alias, santo apenas houve UM: Jesus, este, por ironia do destino, morreu com os braços esticados na cruz por culpa de 20 vintens.

2. Como sempre, fui mal interpretado. Não se trata aqui de coerência, apenas contextualizo os casos. E sempre fui assim. Se digo que a Frelimo é besta e de facto é, nao quer dizer que nao haja oasis dentro dela que faça a diferença. Tanto é que as penas, se houvesse um tribunal a serio, nao seria igual para todos.

Sei separar Rebelo do posicionamento da Frelimo (como bloco). Eu compreendo, sou afinal um tipo polissémico. De resto isto é verdade, porque não comungo com a visão de mente limpa que muita das vezes se passa por aqui. Os herois mundiais foram por causas sangrentas e, alias, as nossas proprias conquistas também. Nao fosse isso, se tudo fosse facil, estariamos no jardim de eden a refrescar a brisa do paraiso.

3. Sabe Mutisse, que fique claro uma coisa: a história do mundo nunca foi de moral. Não se engane meu desconhecido amigo, e nem se deixe enganar. Voce consegue ver Rebelo num ângulo de liberdade, de independencia, mas nao consegue - desconsegue mesmo - vê-lo num contexto em que este, Rebelo, por ditadura das circunstancias, virou "lobo". Eu compreendo, é memoria fraca que ataca os Homens, a todos nós.

4. Tenho pouco tempo para descrever aqui exemplos concretos que provem a minha aloucucao. Portanto, eu fico com a minha incoerencia face à Rebelo e você, com toda a legitimidade, que fique com a sua sabedoria, com a sua justeza moral. Porem, aconselho-lhe a ler Teixeira de Pascoaes para compreender que este mundo nao ha camarotes, nao ha telespectadores, a vida, diz ele, é um palco onde toda a gente representa e para o MAL. Isto é verdade.

5. Vembane, estimei os seus apodos. Nao sei se lhe devo responder, mas como esta é a minha ultima intervencao face à este post, aqui me fico com um lamento: conhece MAL os processos historicos em geral, neste caso, de Rebelo (ve-se pelo que argumenta). Fiz-lhe uma pergunta, por acaso ja ouviu Chissano dizer mal do seu partido?

Zicomo

AGRY disse...

Uma discussão muito acalorada e “clubistica” perseguida pela tentação de adulterar e reinventar a linguagem e os conceitos num mero exercício apologético dos regimes neoliberais, chamados democratas, também ditos ocidentais, procurando-se o fio condutor para fundamentar politicas e regimes anti-populares.
Foi bom passar por aqui e encontrar material para reflexão e, quem sabe, para uma postagem

Julio Mutisse disse...

Com muita pena minha, apesar de respeitar a decisao, Viriato decidiu retirar se do debate. Sai depois de apelar a ideia de que nao consigo ver o Camarada Jorge Rebelo de um angulo de que pouco percebi. Eh uma pena. Continuarei sem perceber.

Uma coisa que fique clara aqui. O tempo de Samora para o qual, insistentemente o Camarada Rebelo apela (qual depositario da moral que devia ser seguida pelos governantes de hoje) teve suas coisas boas e coisas mas, dentro de um contexto proprio. As coisas boas (a criminalidade baixa e/ou os baixissimos indices de corrupcao por exemplo) tinham por de tras um conjunto de coisas que as tornavam possiveis. Olhamos para essas coisas hoje... tanta saudade que, como diz o Mapengo “Saudades sim mas ninguém quer voltar porque não podemos esquecer o tempo que passou... eram bons tempos aqueles que ninguém quer mais voltar” e, nao voltamos nao so porque tomamos um rumo diverso mas, fundamentalmente porque as coisas que tornavam possiveis as coisas boas daquele tempo, sao praticamente impossiveis nos tempos e no contexto politico, legal, social e economico que vivemos.

Nao me apregoo, ao contrario de si, depositariuo da moral nem de qualquer outra coisa que se assemelhe. Ao contrario de si que, com o apoio que da aos ditos bombasticos e apeladores de aplauso de um sector que nos tempos de Rebelo (a quem apoias) seriam impossiveis, nao olho para o passado a que pertenci num determinado contexto e o esfrego a sua cara com tanta simplicidade como quem masca uma pastilha, sem dizer a quem me aplaude que nesse lado BOM a que pertenci eu, de certa forma, controlava uma maquina tao grande de controle social que ja nao existe nos dias de hoje por forca das mudancas que EU e meus pares ajudamos a firmar.

Quando te convem meu caro Viriato (e isso acontece em situacoes em que, aparentemente, ha algo que "manche" a FRELIMO e/ou o seu Governo) passas por cima das tuas proprias conviccoes. Dai apelidar-te de incoerente. Passas a vida a dizer nestes espacos que a FRELIMO escangalhou o pais, nao fez nada que preste, bastou o sacro-santo JR vir a publico falar do seu tempo sem corrupcao e sem bandidos para mudares e apelares que voltemos ao tempo que passou que nao podemos esquecer. Hawena pa.

Zicomo por teres passado por aqui. Obrigado, Yinkomo, Khanimambo, Ndzi Khensile (como es conhecedor de TODAS linguas nacionais saberas o que estou a dizer.

Julio Mutisse disse...

Agry

Nao sei a que te referes quando falas de discussao “clubistica”. Juro que nao.

Tambem nao sei de que falas quando te referes a "tentação de adulterar e reinventar a linguagem."

Presumo que discordas do que digo no meu post original e do que tem sido dito por outros opinadores neste espaco. Infelizmente nao disseste da sua justica e teremos que esperar por um post que pode nao surgir...

Eh a vida.

Julio Mutisse disse...

A proposito, no semanario Magazine Independente desta semana publiquei uma reflexao exaustiva sobre este assunto questionando o que se passa ao meu ilustre camarada Jorge.

Nelson disse...

Estive ausente por dois dias e parece que a coisa quase pegou fogo por aqui. O V.Dias foi mal compreendido. Não sei se pela forma quanto amim complexa como apresentou suas ideias ou pela incapacidade dos seus pares. Retirou-se do debate mais deixou ficar uns pontos que gostaria de explorar.
Penso que concordo ainda que parcialmente com ele quando diz que “Samora aparece num período conturbado da História Mundial” e dai fala de “crispação entre as grandes potências mundiais” segue para “a situação geoestratégica de Moçambique” para finalmente concluir que diante da “instabilidade conjuntural e mundial”, Samora não tinha outra saída se não ser como foi e governar como governou. Usando esse raciocínio solidamente histórico, parece que V.Dias pretende “inocentar” Samora pelos desastres de sua governação chegando a considerá-lo um “pecador” justo enquanto que eu usando o mesmo me questiono se diante duma conjuntura mundial diferente, Samora seria o mesmo e ou governaria como governou.
Ainda dentro dos pontos deixados por V.Dias, concordemos por exemplo que “que a Frelimo actual é contrária as orientações partidárias de base, ou seja, de Mondlane, de Machel”, onde estava Rebelo enquanto a Frelimo passava por essa metamorfose? Que eu saiba nunca esteve ausente da organização para hoje vir do jeito que vem falar.
Para terminar com os pontos do V.Dias me pergunto Quem faz eco a quem? Eu acho que é Rebelo que faz eco à sociedade Moçambicana e não o contrário. Basta escutar Edson da Luz(Azagaia) para concluir que oque Rebelo diz, já foi dito. E não é que Rebelo não tenha receio, a verdade é que já não há oque recear. Nos novos tempos que vivemos, com todos os seus males, destaquemos a corrupção, existem liberdades que nos permitem falar oque quisermos e como quisermos sem receio algum.
Eu acho um exagero que o mérito pelos níveis baixos de corrupção se atribuam unicamente à Samora. Um exagero descarado.

Julio Mutisse disse...

Bem vindo Nelson,

De alguma forma, todos falamos no contexto em que a governacao samoriana ocorreu. Tenho falado do contexto politico, social e ate economico. O que Viriato trouxe, que ao que entendo do que dizes, eh o contexto global que, de nada, invalida o que eu e outros aqui temos dito.

Dentro desse contexto global a que Viriato faz referencia e ate no contexto local, as coisas boas foram potenciadas por uma serie de coisas que sao impossiveis face a mudanca encetada e de que JR, como mebro do Partido e decisor politico em determinada era, faz parte. Nao se trata aqui de fazer juizo de valor sobre se aquele seria ou nao o modelo adequado na fase em que o modelo de governacao samoriana foi implantado.

Estamos a falar de questoes como corrupcao, criminalidade quase inexistentes no tempo de samora e em alta nos tempos que correm. Estamos a dizer que sim nao havia criminalidade e a corrupcao era algo de que nao se falava mas tudo dentro do seu contexto com os GVP, Chefes de 10 casas, chefes de quarteirao, GD's, milicianos que exerciam em nome da sociedade um controle grande que impossibilitava essas coisas. No contexto hodierno de primazia das liberdades individuais isso eh impossivel.

Nelson, eh por essas coisas que Ouso dizer que, mesmo Samora, se fosse vivo nos dias de hoje, teria que enfrentar maior criminalidade e corrupção, fenómenos que, a meu ver, independem da personalidade e perfil de Samora tendo, isso sim, a ver com o relaxamento da pressão colectivista da sociedade e mais incentivos à iniciativa e promoção do individuo. Tem a ver com a eliminação dos controles que um dia tivemos com os chefes das 10 casas, chefes de quarteirão, milicianos e outros agentes omnipresentes no modelo samoriano.

So isso. O contexto geopolitico pode ser chamado como quaisquer outros.

Reflectindo disse...

"Eu acho um exagero que o mérito pelos níveis baixos de corrupção se atribuam unicamente à Samora. Um exagero descarado." Nelson

É o que tenho apelado para reflexão.

"os GVP, Chefes de 10 casas, chefes de quarteirao, GD's, milicianos que exerciam em nome da sociedade um controle grande que impossibilitava essas coisas." Mutisse

Isso pode ter feito parte, mas não acredito que seja tudo o que evitava a corrupcão naquela era samoriana. Quando empiricamente volto ao tempo encontro múltiplos factores, alguns deles até podem ser negativos.

Uma outra coisa que tenho reflectido é o facto de falarmos da era samoriana num contexto muito genérico como se esta fosse linear. Quando volto ao tempo e faco comparacões, concluo que a corrupcão já florescia no país nos últimos anos da vida de Samora. Tenho exemplos da corrupcão na educacão a partir de 1983 e penso que Aires Ali não os negaria. É daqui onde também temos que pensar no impacto da guerra nem que seja indirectamente.

Na verdade, não é que eu não concorde com a crítica de Jorge Rebelo, mas não estou a perceber o que ele quer nos transmitir. Fala de pessoas honestas com nomes como Ivo Garrido, Siba-Siba, Carlos Cardoso, mas que há ministros sem nomes que enriquecem com base na corrupcão. Quais são? Nas qualidades de Rebelo, penso que não devia ser assim e nem usar o exemplo de António Munguambe como fosse ele e os seus aliados que o denunciaram. Portanto, para mim, Rebelo, Marcelino dos Santos e Graca Machel deviam usar a sua crítica nos conselhos de ministros alargados (suponho que são convidado), nas sessões do Comité Central criando normas contra a corrupcão dentro do partido. Da forma que fazem crítica só podemos concluir que estão fazendo propagandas do COMUNISMO e assim há quem os lancam para o regresso. Eles se zangam connosco quando recusamos esse regresso.

Outro aspecto que acho importante, é não falarmos apenas de Rebelo, mas também da postura da Graca Machel e Marcelino dos Santos. É que pelo menos Rebelo concorda com o multipartidarismo

Nelson disse...

"Foi bom passar por aqui e encontrar material para reflexão e, quem sabe, para uma postagem" Agry White

Eis o post:

http://agrywhite.blogspot.com/2010/11/proposito-dos-criticos-em-mocambique.html