Resíduos Sólidos Urbanos
Júlio S. Mutisse
Não poucas vezes, a imprensa e diversos sectores da sociedade lançam duras
críticas às principais cidades do país, principalmente no que tange à recolha
de resíduos sólidos urbanos (RSU). Os munícipes fazem coro a estas críticas
acrescentando o dado relativo à taxa de lixo que se paga. Em parte, têm razão
os munícipes quando mencionam a taxa paga; é que ao nosso dever de pagá-la corresponde o dever
dos municípios em manter as cidades limpas apesar da insuficiência de meios
conhecida.
Na verdade, em grande parte das nossas cidades em Moçambique, quando se
fala em RSU aborda-se apenas a perspectiva da sua recolha e deposição em lixeiras.
São exemplos dessa situação os cenários que actualmente assistimos nas lixeiras
de Hulene, Infulene A ou mesmo Malhampsene falando das realidades de Maputo e
Matola respectivamente, duas grandes cidades que ainda trabalham para ter um
verdadeiro aterro sanitário que representaria uma evolução no sentido de maior
controlo em relação à actual situação da deposição descontrolada de resíduos
sólidos como vem acontecendo actualmente em muitos municípios nacionais e não
só.
Esta evolução para verdadeiros aterros permitiria
a vedação e a imposição de restrições ao acesso a esses locais, o controlo dos
resíduos à entrada, o conhecimento pormenorizado do tipo de resíduos
depositados, a existência de controlo de pragas, a valorização e queima controlada
do biogas produzido pelos resíduos e a prevenção da contaminação das águas superficiais ou subterrâneas numa realidade em que uma boa
parte da população residindo nos nossos municípios é abastecida com água
proveniente de furos.
Para esta acção, os municípios teriam que
contar com uma grande colaboração dos munícipes no que tange ao tratamento
primário dos resíduos sólidos, sua gestão, separação, bem como nas condições e
periodicidade de depósito para posterior recolha para as lixeiras e, numa fase
avançada, para os aterros a criar.
O país tem exemplos felizes que podem ser
replicados. O Centro Terra Viva noticiava no seu site em Dezembro de 2010 que a
praia do Tofo em Inhambane apresentava-se limpa, mercê do empenho da Associação
de Limpeza e Meio Ambiente (ALMA), uma organização não governamental que, desde
2007, em parceria com os moradores daquela zona balnear, implementa um programa
de recolha selectiva dos resíduos sólidos para a reciclagem e/ou reutilização.
Citando o coordenador do projecto a Terra
Viva refere que, antes da implementação daquela iniciativa, “em quase todas as
ruas da Praia do Tofo se via lixo amontoado nas bermas e, nas ocasiões de maior
frequência de banhistas, como no verão ou por altura da Páscoa, os resíduos
sólidos obstruíam a principal via que liga aquela praia à cidade de Inhambane.”
De certeza que este cenário será comum a muitas cidades por este país fora.
Porém, a situação mudou “não somente na aparência agradável e acolhedora do
vilarejo do Tofo, como também a mentalidade das pessoas que ali vivem
e/ou trabalham, em relação ao lixo.” (destaque e sublinhados nossos).
Segundo a mesma fonte, “desde que a ALMA criou um Centro de Tratamento Primário
de Resíduos Sólidos no Tofo, o lixo virou fonte de rendimento e passou a ser
depositado separadamente em locais apropriados e recolhido semanalmente por uma
equipa composta por quinze elementos.” Os resíduos inorgânicos depositados,
depois de lavados, uns são reutilizados localmente e outros, vendidos às
empresas que se dedicam à reciclagem sendo que o dinheiro obtido no negócio é
canalizado aos catadores como factor de motivação garantindo a sua continuidade
na limpeza da Praia do Tofo.
Portanto, para além da evidente
necessidade de os municípios se aquilatarem para o cumprimento da missão de
manter as cidades limpas emerge uma necessidade urgente de todos nós mudarmos a
nossa visão em relação aos RSU. A tarefa de vivermos num ambiente são começa
connosco sendo por isso necessário nos
apropriarmos dos esquemas montados pelas cidades em que vivemos para a recolha
de RSU. Tomando o exemplo do Tofo, o RSU é recolhido semanalmente. Conhecedor
desta realidade cabe a cada morador do local gerir os resíduos domesticamente
produzidos de modo a que sejam depositados nos locais indicados na data e hora
(eventualmente) prevista para a sua recolha. De outro modo, corremos o risco de
ter, por longos períodos, RSU acumulados como resultado do não acatamento deste
género de instruções que, muitas vezes, resultam da incapacidade conhecida dos
municípios em recolherem diariamente os RSU em toda extensão urbana, razão
porque muitos adoptam um calendário de recolha semanal por bairros.
Para além de tirar na data e hora indicada
para cada local, urge separar o RSU até tendo em vista a sua transformação em
produtos novos para consumo. Estamos a falar da reciclagem que, para além da
vantagem decorrente da preservação ambiental é também geradora de riqueza,
contribuindo para a redução significativa da poluição tanto dos solos, do ar como
da água para além, claro, da vantagem que resulta do emprego de muita gente. Se
no exemplo referido da praia do Tofo têm emprego quinze pessoas, imagine-se o
efeito multiplicador em grandes centros urbanos como Maputo, Matola, Beira,
Nampula ou mesmo Quelimane.
O encerramento de lixeiras e a adopção de
formas mais modernas de tratamento e gestão de RSU é um desafio grande para as
nossas cidades que deverão, dentro dos seus planos estratégicos, espreitar
igualmente as oportunidades de negócios que podem ser gerados a partir dos
aterros sanitários donde destaco a produção de energia a partir do biogas
emergente dos RSU. Sim, os aterros não devem ser vistos apenas na perspectiva
do depósito controlado do lixo; devem ser vistos igualmente na perspectiva de
uma potencial área de investimento e um instrumento sempre a mão no bilionário
negócio dos créditos de carbono. Diz-se que o metano, principal componente do
gás de aterro, é 21 vezes mais danoso ao efeito estufa do que o CO2 de onde
resulta um grande potencial na famosa contabilização dos créditos de carbono.
O
sucesso destas iniciativas requererá uma colaboração franca não só dos
munícipes mas de outros entes que, também, intervém ou podem intervir na gestão
de RSU. O controlo dos resíduos à entrada que leva ao conhecimento
pormenorizado do tipo de resíduos depositados só é possível se existir de todos
nós uma colaboração efectiva que facilite o cumprimento deste desiderato de
evolução. Tanto os contentores como as próprias lixeiras registam um movimento
desusado de pessoas que trabalham na recolha de resíduos que depois são
vendidos a diversas entidades. Há, afinal, valor no lixo. Então, mesmo antes do
advento do aterro no sentido a que nos referimos acima, podemos desde já
começar a ensaiar formas de gestão de RSU que começam de cada produtor de
resíduos até a sua deposição nos locais indicados para o efeito. Fazendo isso
desde já, chegaremos ao tão almejado aterro já “maduros” no tratamento adequado
que devemos ter dos resíduos que produzimos, meio caminho andado para que o
aterro a chegar cumpra eficazmente o seu papel. Através das estruturas que
existem nas nossas cidades, urge iniciar um processo de informação e formação
das pessoas no sentido de todos se envolverem na gestão dos RSU adoptando
práticas adequadas para o efeito como a já referida separação do lixo, a
deposição em locais adequados em datas próprias etc. Só temos a ganhar com esta
postura.
Poderíamos igualmente recuperar bons
exemplos do passado em que, por exemplo, uma conhecida empresa de papel tinha
em Maputo diversos pontos de recolha de papel para a reciclagem. Poderíamos
replicar isso para o plástico e outros materiais recicláveis. Pode ser que, no
fim do dia, só restasse uma parte pequena de RSU a serem recolhidos pelos
municípios para as lixeiras e, mais tarde, para os aterros.
Somos todos parte do problema da gestão de
RSU e podemos todos fazer parte da solução. Bastarão estratégias claras,
formação e informação e, acima de tudo, mente aberta para mudar mentalidades e
aceitar novas formas de estar em ambientes urbanos produtores de grandes
quantidades de RSU que requerem tratamento e gestão.
Vamos a isso. Somos capazes.
Um comentário:
Mutisse, Quero lhe saudar por este belíssimo texto. Porém, como tenho vindo a dizer os Conselhos Municipais precisa de se apetrechar por gente competente capaz de planificar,organizar,comandar, coordenar, controlar e avaliar o processo que nos propõe se não dada feito. veja a racionalidade exige (técnica de fazer bem), o RS custam dinheiro material reaproveitável (Comercialização), há que gerar dinheiro com RS. o CMCM não sabia pelo menos cobrar imposto a um fulano que faz reciclagem de lixo nos moldes industriais na lixeira de Malhampswene, nós é que alertamos que era possível. a outra coisa é a Segurança (proteção e preservação dos meios e pessoas) em Malhampswene so falta um dia queimar o bairro porque vezes há que as chamas atingem controlos incontroláveis por causa do cratão. os Bombeiro uma vez vieram ter uma dificuldade inorme para debelar o fogo que acabou queimando algumas peças numa das casas. a Gestão do lixo é urgente e extremamente prioritária nas actividades dos Conselhos Municipais porque o Lixo provoca doenças, degrada vias, provoca inundações bloqueiando condutas de escoamento das aguas em caso de chuvas etc... mãos a obra
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