Cidadania
Júlio S. Mutisse
Mia Couto, esse celebrado e
premiado escritor moçambicano deu uma interessante entrevista enquanto esteve
fora para receber mais um prémio do qual lhe dei os meus parabéns há semanas
neste espaço.
A dita entrevista está a dar
espaço a muitos debates nas redes sociais e fez me lembrar um texto da autoria
de Amosse Macamo largamente discutido no Blog Ideias Subversivas, com o título os
“Embaixadores da Desgraça.” Nesse texto, Amosse defendia a tese de que quando
estamos lá fora, devemos
informar com responsabilidade coisa que “depende da consciência cidadã de
cada um”, sendo que, o “recomendável seria colocar os desafios alcançáveis em
vez de expor os problemas, muitas vezes ideológicos.” Alguns dos problemas que o Mia colocou nessa
entrevista são ideológicos; afinal, segundo ele, houve mudanças e há coisas com
que já não concorda na actual orientação da FRELIMO a que ele se engajou desde
a luta de libertação nacional (?).
O mundo está em crise e as
notícias não falam noutra coisa. Portugal, de onde foi dada a entrevista, está
nas cordas, Espanha idem e a Grécia está no tapete. Mas não são os únicos, o
mundo todo está em crise. Enquanto muitos avançam soluções economicistas e
outras no sentido de garantirmos maior produção, Mia refere que “é preciso sair
à rua; é preciso revoltarmo-nos; é precisa esta insubordinação.” É por esta
tirada que o Mia é acusado de incitar a violência. As pessoas que vivenciaram e
foram vítimas, estão “presas” aos fenómenos de Fevereiro e Setembro de há uns
anos e a imagem que se tem de sair a rua é a que nos foi dada a assistir nesses
eventos.
Concordo com o Elísio Macamo
quando, na discussão do texto do Macamo Amosse a que me refiro acima, referiu
que "O único que se devia esperar de todos nós é falar com
responsabilidade dentro e fora do país. Falar com responsabilidade não é dizer
o que não prejudica o país (porque isso seria difícil de determinar), mas sim o
que é passível de ser discutido de forma construtiva na esfera pública"
Temos conseguido? Me parece que não.
Creio que, no caso em alusão o Mia, conhecendo a nossa realidade que, de longe,
não se compara com a realidade europeia onde o tal movimento dos “indignados”ocorre
e num contexto especifico, deveria ter sido mais comedido até em função da
repercussão das suas palavras. Já dizia o Amosse num comentário ao texto a que
tenho feito referência “não se logra equilíbrio sem a consciência de cidadania”
e, para mim, este conceito de cidadania aliado a tal ideia de responsabilidade
de que fala o Elísio Macamo é essencial.
É pois necessário despertarmos para
o exercício de uma “Cidadania consciente” que, quanto a mim, passa
fundamentalmente pelo conhecimento dos nossos direitos que servirão de guias no
seu exercício e na participação política que devemos ter. A cidadania é aqui
tomada como expressão de “um conjunto de direitos que dão à pessoa a
possibilidade de participar activamente da vida e do governo de seu povo”
segundo a definição de DALLARI (Direitos Humanos e Cidadania. São Paulo:
Moderna, 1998. p.14.) que acrescenta que “quem não tem cidadania está
marginalizado ou excluído da vida social e da tomada de decisões, ficando numa
posição de inferioridade dentro do grupo social.”
Um dos direitos que a
Constituição da República de Moçambique nos confere é o da manifestação nos
termos da lei. A violência, o luto e a destruição tem feito parte do cardápio
das “manifestações” que temos assistido nos últimos tempos, coisas de má
memoria que ninguém quer ver repetidas. É, se calhar, por isso que muitos não
vêem nos ditos do Mia outra coisa que não seja incitamento a violência pela
experiencia de “manifestação” que tivemos nos últimos tempos. Parece consensual a condenação da violência
cometida pelos manifestantes de Fevereiro e Setembro. Tirando a violência
encontraríamos certamente o exercício da tal cidadania através das
manifestações contra as decisões públicas, fenómenos e políticas que ditam a
subida do chapa, do pão e outros produtos básicos, num exercício similar ao que
é feito em várias partes do mundo.
Mas, para chegarmos lá precisamos
interiorizar este conceito de cidadania; este conceito de pertença e de que
somos todos parte do problema e todos parte da solução. Quando chegarmos ai, a
ideia de uma manifestação não nos assustará porque significará pura cidadania e
não violência como tem sido até agora. É preciso que assumamos que a cidadania
de que falamos aqui é construída e conquistada a partir da nossa capacidade de
nos mobilizarmos, participarmos e intervirmos responsavelmente na nossa
sociedade. Esta ideia de cidadania não cai do céu, a sua consagração
constitucional não deve ser tomada como a realização dos direitos a ela
inerentes, é fundamental que cidadão participe, seja activo, faça valer os seus
direitos, construindo novas relações, consciências e vivências na vida social e
pública.
A educação é fundamental para a
construção do ideal de cidadania e para o despertar de consciências sobre a
coisa pública. É imperioso despertar a cidadania divulgando-a através de
instituições de ensino e meios de comunicação para o bem-estar e
desenvolvimento da nação.
Será exercitar a nossa cidadania assumir que somos parte do problema e que algumas soluções que esperamos sempre dos outros (normalmente o Governo, os Municípios ou outros entes públicos) podem brotar de nós. Assumirmos isso far-nos-á compreender que o desejo de vivermos, por exemplo, numa cidade limpa passa por não jogarmos papeis, cascas de banana, latas ou garrafas de cerveja no chão e em qualquer sítio, despertará a necessidade de gerirmos o lixo produzimos, inibir-nos-á de vandalizar infra-estruturas públicas como telefones, bocas-de-incêndio nos nossos prédios etc. Será igualmente exercitar a nossa cidadania quando, fazendo as coisas correctamente, conscientemente interpelarmos o Estado no sentido deste cumprir com a sua parte fornecendo mais e melhores serviços públicos, definindo políticas que produzam benefícios reais nas nossas vidas.
Será exercitar a nossa cidadania assumir que somos parte do problema e que algumas soluções que esperamos sempre dos outros (normalmente o Governo, os Municípios ou outros entes públicos) podem brotar de nós. Assumirmos isso far-nos-á compreender que o desejo de vivermos, por exemplo, numa cidade limpa passa por não jogarmos papeis, cascas de banana, latas ou garrafas de cerveja no chão e em qualquer sítio, despertará a necessidade de gerirmos o lixo produzimos, inibir-nos-á de vandalizar infra-estruturas públicas como telefones, bocas-de-incêndio nos nossos prédios etc. Será igualmente exercitar a nossa cidadania quando, fazendo as coisas correctamente, conscientemente interpelarmos o Estado no sentido deste cumprir com a sua parte fornecendo mais e melhores serviços públicos, definindo políticas que produzam benefícios reais nas nossas vidas.
Quando compreendermos isso,
seremos conscientes e agiremos em conformidade perante qualquer apelo a
insubordinação; saberemos se necessária ou não em função da nossa acção e
atitude para que o resultado que esperamos aconteça. Mas, desenganem-se, Mia
Couto não deseja violência em Moçambique. Isso lhe prejudicaria sobremaneira;
não que ele pudesse estar na linha da frente, gritando palavras de ordem ou
empunhando cartazes… isso fariam outros de certeza. Os empresários não gostam
de perder dinheiro com greves, manifestações ou arruaças.
2 comentários:
Caro Mutisse, se queres discutir sobre cidadania porquê näo queres discutir sobre o caso de Ntutupué, Metero em Cabo Delgado e mesmo tempo que tens tanto tempo para falares de lazeres?
Vamos ser sérios, compatriota!
Agora Reflectindo ém quem distribui as agendas de debate dos outros bloguistas? Deixa o Muthisse discutir o que ele quer. fale você mesmo desses lugares que menciona, indicando claramente qual é a sua posição. Josué
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