Está interessante o debate sobre o tema em epígrafe. Está interessante crusar duas áreas do saber na análise desta questão. É por isso que avanço para esta empreitada de destacar dois pontos de vista expressos nos comentários ao texto original. O primeiro é da Maria João Hunguana (jurista) e o outro do professor Elísio Macamo (sociólogo). Pretendo que sejam um novo ponto de partida na análise desta questão.
Maria João Hunguana disse:
Por força do último comentário (de Elísio Macamo), sou forçada a pensar que apartir de algum momento acabamos nos desviándo do cerne da questão ou pelo menos, salvo melhor entendimento, me parece que se está a olhar pro mesmo problema apartir de 2 prismas (o que até é salutar) mas que nos pode levar a implicações diversas, por isso gostaria de chamar à colação um excerto do comentário do Júlio: A subjectividade do elemento VONTADE "evapora" a aceitabilidade da falta de idoneidade do meio por o indivíduo ser polícia ou por outra qualquer.”
Penso que este sim, é o cerne da questão, ou seja, uma coisa é falarmos da censurabilidade jurídica do comportamento das manas e outra é assacarmos da censurabilidade do comportamento do polícia (e aqui nos debruçarmos sobre o elemento intencional relativamente a este agente), embora em algum momento nos possa ser difícil olharmos pra estes agentes (manas incluídas) isoladamente, pois podemos ser confrontados com algumas questões próprias da teoria criminal, como por exemplo a problemática da autoria moral sem autoria material, cumplicidade sem autoria, etc.
Mas voltando ao que interessa, penso que o fundamental é analisar o comportamento das manas, abstraindo-nos do facto do suposto autor material ser ou não polícia. È que continuo com dificuldades de perceber em que é que a qualidade de polícia, suposto autor material pode determinar a impossibilidade de censura de um comportamento, a partida ilícito e condenável pela ordem jurídico-penal.
O meu entendimento é o de que, ainda que as manas soubessem que o potencial carrasco era polícia, o que releva é o carácter sério com que a exteriorização dessa vontade foi feita, neste caso dirigida a obtenção do resultado proibido por lei e desde que qualquer pessoa no lugar do carrasco, independentemente da profissão que tenha, pudesse tomá-la como uma vontade consciente e não viciada (excluo aqui o vício do erro sobre a pessoa, que poderia ser o caso de desconhecerem que se tratava de polícia, mas que quanto a mim não releva pra efeitos de censura jurídica da acção em causa), independentemente dessa pessoa que recebe a declaração (o carrasco) executá-la ou não. "se for provado que o polícia não tinha nenhuma intenção de executar o acto, então a tentativa é impossível".
O problema, na minha opinião, não está na vontade do polícia, pelo menos não a prior, senão cairíamos no cúmulo de fazer depender a punibilidade das manas da idoneidade do polícia, isto é, se o polícia declarasse em tribunal que nunca lhe passou pla cabeça cumprir o acordo, as manas sairiam ilibadas, ainda que se provasse terem empreendido actos preparatórios dirigidos a causar a morte do pai!! A justiça ficaria então refém do carácter moral do polícia que até poderia ser novamente “aliciado” pelas manas para ilíbá-las em tribunal! Portanto o ser polícia aqui não pode, em minha opinião, significar inidoneidade do “meio” necessário a obtenção do resultado morte, simplesmente porque ninguém pode garantir que um polícia é incapaz de agir dolosamente contra qualquer bem protegido pelo Direito só porque é polícia.
E poderia até colocar a questão noutros termos: imaginem que o polícia decidisse que apenas daria um susto a vítima, não obstante ter se comprometido perante elas a fazer o “serviço” e assim que se deparasse com esta só de lhe apontar a arma (pra assustá-lo)a vítima caísse morta e mais tarde o polícia viesse a saber que aquela tinha problemas de coração! Objectivamente considerando, o acto de apontar uma arma a alguém, sem premir o gatilho, não é uma conduta idónea a produção do resultado morte..então pergunto, a atitude do polícia seria totalmente ilibada por esse facto? E, quanto as manas, continuariam impunes porque a vontade do polícia não era matar mas apenas assustar? Vamos debater!
Elísio Macamo disse:
Bom, vamos debater, Maria João. gostei imenso da sua reflexão e pergunto-me se percebo o que está em questão. do ponto de vista sociológico interessaria perceber o que torna difícil não dar ao agente policial o benefício da dúvida que a autoridade moral do seu cargo acarreta consigo. só isso. do ponto de vista jurídico sou completamente leigo para discutir. o que tentei fazer foi perceber o que o vosso colega advogado disse. e parece-me fazer sentido, embora com os vossos comentários comece a pensar que o problema seja a expressão "tentativa impossível". de facto, vistas as coisas a partir deste prisma, o vosso colega pode estar equivocado. mas aí a discussão é semântica e não jurídica, acho.
A minha proposta:
A partir destes dois pontos de vista gostaria que prosseguíssemos o debate e analisarmos a questão nos mais diversos angulos que a mesma nos possa oferecer.
De facto a expressão "tentativa impossível" usada pelo colega Cuamba para qualificar a questão é problemática. Alias, ele próprio afasta a punibilidade daquele acto por considerar ou concluir tratar-se de uma tentativa impossível.
Há elementos do ponto de vista jurídico que se podem ainda agregar neste debate e, de certeza, do ponto de vista sociológico há tantos outros. Desprendamo-nos das amarras e inteliguemos os saberes para perceber este fenómenos que ocorrem com alguma frequência na nossa sociedade.
Um abraço ao debate.
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