Crítica da Crítica
Júlio S. Mutisse
Julio.mutisse@gmail.com
Ideiassubversivas.blogspot.com
Não é que tenha preguiça de escrever, nem é minha intenção fugir aos temas a que me propus e prometi semana passada.
Não.
Estive num debate. Aliás, estive na negação de um debate. Enquanto tentava elaborar sobre esta negação ocorreu me um texto do Patrício Langa (publicado na íntegra aqui) que adapto nas linhas abaixo, concordando com ele na íntegra: de facto a nossa a maior pobreza absoluta – a mais insidiosa e perniciosa que se abate sobre Moçambique – é aquela da sua "massa" crítica.
O pior é que essa pobreza é a mais difícil de combater, pela sua própria natureza. É reflexiva (cognitiva) e não material! Não há uma linha que a relativiza ou a absolutiza através da contagem de dólares ou calorias consumidas diariamente.
Não há PARPA para erradicar os efeitos de uma forma perniciosa de pensar e de fazer crítica. A solução que se aventava apropriada, por alguns de nós, "os críticos dos críticos", portanto, a do debate de ideias que inclui o debate dos critérios do debate é, perversamente, rejeitada pelos críticos. A única crítica considerada, pelos críticos, de válida é aquela que têm no Governo seu maior e principal alvo. E, nisso, não reside apenas concepção reducionista da realidade, mas uma pobreza analítica de assustar.
É que nessa crítica ao Governo, e já agora, aos "críticos dos críticos", repetem-se, incansavelmente, os mesmos erros de procedimento e de raciocínio no debate de ideias. Um desses erros de procedimento, por exemplo, e que não me canso de apontar é o julgamento das intenções. De certeza, que os críticos, ao lerem este texto a primeira coisa que lhes vai ocorrer é julgarem a minha intenção ou não de defender o Governo. Vão querer saber de que lado estou. Vão dizer, como já o fizeram, que quero aparecer, contrariamente a eles, os críticos, que já são consagrados.
Como já fui, várias vezes, acusado de estar a querer fazer gracinhas ao Governo, e não tenho nada a perder, insisto na seguinte observação. Se não existisse Governo, no nosso país, não teríamos críticos, pelo menos, da qualidade que temos. Criticar o Governo é a razão de existir de alguns que se intitulam de críticos.
E mais, os tais críticos se consagraram e se legitimam, justamente, pela razão que os produz: criticar o Governo! Não é a plausibilidade de seus argumentos que serve de critério. É a sua declarada “ boa intenção” a favor dos deserdados que conta. Nem se lembram ao criticar que as mesmas exigências que fazem aos outros possam ser usadas para si próprios. Se os críticos bem intencionados criticam aos críticos dos críticos; o que dizer dos críticos dos críticos dos críticos? Os críticos, já agora, fazem a Consagrada Família que abunda na nossa esfera pública e a empobrece pelos seus métodos.
Os críticos, mais comuns entre nós tem aversão aos que acham que o que Moçambique mais precisa, neste momento, não é de críticos que fazem o mais fácil dentro da sua prerrogativa de críticos: criticar o governo. Isso qualquer um pode fazer! Agora, uma crítica analiticamente prudente e politicamente responsável não se faz com ataques fáceis ao Governo e, já agora, aos críticos dos críticos! O fraco desempenho do Governo podia até ser atribuído a fraca qualidade da crítica que lhe é feita pelos seus críticos.
4 comentários:
Um dos dados mais seguros para avaliarmos o grau de democracia num País é a tolerancia à crítica e o respeito pelas ideias divergentes. Nesse aspecto Moçambique ainda esta muito longe na construçao da democracia que desejamos e isso preocupa-me muito!
José,
Não podemos querer construir uma democracia com pensamento único. Não podemos querer nesta fase agir como nos primeiros anos de independência com forte tendência a buscar unanimidade. Parece isso que acontece de um segmento grande da nossa esfera pública.
Para muitos criticar é dizer mal do Governo. Dê uma volta pela esmagadora maioria do FB e encontrará isso. Se calhar o mau desempenho que se critica do Governo venha mesmo dai: da deficiente crítica à sua actuação por parte dos seus críticos.
Uma tentativa de enquadrar a actuação governativa num contexto que nos permitiria ver as soluções possíveis nesse contexto é normalmente rotulada, uma colocação de simples concordância com um acto do governo idem. Não podemos ir a frente assim. Não podemos ser unanimes no achincalhamento e, ao mesmo tempo, na defesa. Tem que haver espaço para debater o que se pensa estar mal (devidamente fundamentado) e o que se julga estar bem tb fundamentado.
Mutisse, meu amigo, eu já te disse desde há muito tempo, isto é, há anos, que é inútil dedicar-se (qualquer pessoa) a orientar cidadãos na forma de fazer criticar e ou bater palmas, ainda que não se é directo. E o que é ser-se directo? Isso vou propôr ao grupo Diálogo sobre Mocambique.
Posso estar errado, mas da maneira como colocas a questão sobre a crítica ao governo da Frelimo, pode-se entender que estás apenas em defesa do teu partido. Nisso terias razão e direito. O problema de discursos como estes é de serem semelhantes ao evangelho, por um lado. Por outro, confundes qualquer discussão com uma tese de defesa de um grau universitário, isto é, académico. Se estivessemos nesse caso, mesmo este artigo teria muitos problemas para passar.
Um abraço e desejo de um bom fim de semana!
Fui convidado a contribuir com algumas ideias neste debate e sendo a primeira vez que aqui deixo meus comentários cumpre-me inicialmente dizer inicialmente que:
1. Tenho lido de raspão as abordagens do Muthisse e acredito muito nas suas capacidades....sobretudo a manutenção constante do blog....e tendo iniciado a sua reflexão por um emparelhamento ao texto do Professor Langa, outra pessoa que respeito bastante, porém não consinto a conclusão conjunta a que chegaram relativamente ao seguinte:
"...de facto a nossa a maior pobreza absoluta – a mais insidiosa e perniciosa que se abate sobre Moçambique – é aquela da sua "massa" crítica."
Será?
Eu guardo enormes reserevas neste forma de olhar os factos, primeiro porque parece existir um certo conservadorismo nas elites pensantes em admitir que outros o podem fazer. Há muito egoismo nos pensamentos e acções. Sendo difícil olhar com confiança os outros como preparados para criticar, temos igualmente uma grande dificuldade de delegar processos nas organizações;
2. Centrando-me no objecto da discussão devo concordar com Mutisse quando estatisticamente encontra um volume elevado de críticas sobre o Governo. Para mim não é muito estranho isso, alia-se mesmo à busca conjunta das soluções da vida na "pólis". Outra razão a meu ver da acentuada crítica sobre a actividade do governo é mesmo porque para o caso da nossa sociedade, o governo é uma espécie de umbrella dos interesses de todos nós, pelo menos em Moçambique ainda somos uma sociedade que muito espera de uma ideia em falência no mundo de um Estado de Bem Estar Social, portanto vejo muita legitimidade neste constante e diário diálogo crítico com o governo. Para ir de certa forma ao seu encontro, a ser verdade que é "fraco o desempenho do Governo" recordo-me que em anos não muito distantes o conceituado Jornalista Salomão Moyana defendeu o NÃO-SILENCIO, porque os membros do governo eram pessoas de que alguns de nós conhecemos as suas dificuldades desde os anos escolares, ajudamo-los a resolver os problemas escolares, pelo que não era de bom senso que hoje nos mantivessemos calados.
3. Finalmente dizer de forma reiterada que temos muita boa massa crítica em Moçambique, infelizmente teme-se muito as represálias resultantes do discurso porque há muitas escolas de pensamento instaladas na nossa sociedade sobre a recepção e valoração da crítica, pior se for no sentido de contradição.
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