Greve em Época de Grandes Investimentos
Júlio S. Mutisse
Julio.mutisse@gmail.com
Em Moçambique toda a gente faz “greve.” Saimos a rua para manifestar pelo contra a subida do chapa e/ou contra o custo de vida reagindo a subida do indispensável pão, todos falam (até os mais “insuspeitos” órgãos de informação) em greve.
Os chapeiros paralisam os carros contestando não o salário magro ou as más condições de trabalho (desde o carro a cair aos pedaços, horas de trabalho, pressão a que estão sujeitos e os salários invariavelmente magros) mas, isso sim, as más condições das vias ou as cobranças exageradamente ilícitas dos polícias municipais, todos falamos em “greve” dos chapas.
Seja como for, a manifestação, nos termos da lei, é um direito que a constituição atribui a todo e qualquer cidadão. Os Madjermanes exercem no religiosamente há vários anos.
Por seu turno a greve é um direito fundamental dos trabalhadores (e só destes), exercido para a defesa e promoção dos seus mais legítimos interesses.
Este direito fundamental dos trabalhadores tem algumas restrições/particularidades ao seu exercício. Por exemplo, os serviços e actividades destinados à satisfação das necessidades essenciais, os trabalhadores são obrigados a prestar os serviços mínimos indispensáveis à satisfação dessas necessidades essenciais como: serviços médicos, serviços de abastecimento de água e energia, controlo do espaço aéreo, bombeiros e segurança privada.
Sendo a listagem constante da lei do trabalho do que se considera serviços destinados a satisfação de necessidades essenciais, e até considerando o nível de cobertura de energia eléctrica e pela essencialidade do pão na nossa sociedade eu incluiria nesta lista os funcionários (todos) das padarias. Já imaginaram uma greve dos padeiros? Seria um desatre do tamanho do mundo.
É necessário interiorizar o porque do regime especial em sectores que se destinam ao fornecimento de serviços destinados a satisfação de necessidades essenciais como uma forma que o legislador encontrou para garantir a funcionalidade e a continuidade no fornecimento desses bens sem precludir o direito fundamental dos trabalhadores a greve. Se a lei não impusesse serviços mínimos numa greve de médicos, de bombeiros ou dos trabalhadores das empresas de telefonia (no geral) seria um desastre. O regime dos serviços destinados a satisfação de necessidades essenciais é aplicado à greve nas zonas francas. Entende-se que assim seja até avaliando o peso que as exportações de uma Mozal, por exemplo, representam na nossa economia.
O facto de afirmarmos que a greve é um direito que assiste aos trabalhadores para a defesa e promoção dos seus direitos, não implica que se recorra a greve de qualquer maneira, há pressupostos legais que devem ser seguidos para que se lançar mão deste instrumento.
Recorre-se à greve para fazer face a violação dos direitos dos trabalhadores consagrados nos contratos individuais ou nos instrumentos de regulamentação colectiva do trabalho. Recorre-se a greve quando o empregador deixa de cumprir com o que está contratualmente estabelecido nos contratos sobre, por exemplo, remuneração, pagando menos do que o convencionado ou não fazendo as actualizações acordadas ou legalmente estabelecidas, ou quando, simplesmente não paga. São meros exemplos de casos que podem levar a que os trabalhadores decidam pelo recurso a greve.
Mas será que, a despeito dos contratos individuais e/ou dos instrumentos de regulamentação colectiva, posso recorrer a greve simplesmente porque acordei achando me no direito de ganhar mais do que ganho? Julgo que não. Porém, infelizmente, parece ser esta a tendência em muitas greves ocorridas ou nas ameaças de greve. Não devia ser. Entendo eu.
Seja como for temos que conhecer os nossos direitos para que os possamos exercitar coerente e correctamente. Acho que estamos ainda um pouco distantes disto.
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