terça-feira, 24 de fevereiro de 2009

Em Reflexão

O Governo do meu país está num retiro em Namaacha para uma reflexão sobre os "quatro anos de execução do plano quinquenal" e com a pretensão de "identificar os sucessos registados, os constrangimentos que ainda se apresentam, a partir do desenho feito sobre as acções visando consolidar as realizações e buscar formas de superar os desafios do presente", isto segundo o notícias de hoje.

E nós cidadãos, que reflexão fazemos em relação aos 4 anos de execução do plano quinquenal? Que contributo podemos dar para identificar os sucessos e os constrangimentos que ainda se apresentam? De que forma usamos os mecanismos ao dispôr para fazermos chegar os nossos pontos de vista sobre as coisas que nos apoquentam?

Que ligação REAL temos com os deputados que em cada círculo eleitoral elegemos para serem a nossa voz na casa do povo? Por ventura sabemos quem são os deputados que, com nosso voto, ganharam o direito de nos representar na AR? ALguma vez os vimos, ouvimos ou assistimos buscando, de entre os que os elegeram subsídios para as propostas de solução aos problemas da nação?

O Governo está em reflexão. Nós, enquanto cidadãos deviámos estar permanentemente em reflexão; os efeitos das decisões governamentais reflectem-se sobre nós, razão porque há sempre necessidade de, em cada momento, questionar, interpelar os decisores públicos chamando-os a razão sobre as suas decisões. Agindo assim, parafreseando Josué Bila, seremos verdadeiramente cidadãos e não habitantes.

Do ponto de vista legislativo, produziu-se muito. Todos nós, juristas ou não, somos chamados a reflectir sobre o dinamismo (ou falta dele) criado por essa produção legislativa.

Por exemplo, no no âmbito da materialização da política do Governo na área do emprego e ocupação profissional, tivemos o processo de revisão da Lei do Trabalho iniciado em 2004 que a todos interessava, e que teve em atenção o definido no plano quinquenal do Governo, designadamente a necessidade da adopção de uma nova Lei de Trabalho que fosse: um instrumento para a redução dos níveis de pobreza absoluta, um instrumento da promoção do crescimento económico rápido, sustentável e abrangente e um instrumento para a criação dum ambiente favorável ao investimento e desenvolvimento do empresariado nacional e da incidência de acções na educação, saúde e desenvolvimento rural.

Nestes termos, como trabalhadores, empregadores, juristas etc., que avaliação fazemos da implementação da Lei do Trabalho? Foi alcançado o desiderato que determinou a sua revisão?

Temo que ainda não se tenha alcançado tal desiderato principalmente com a lentidão na regulamentação. Temo, também, que ainda não porque (me parece) perdeu-se o fócus que ditou a revisão e, mesmo no que se considerou ser uma conquista na actual lei do trabalho, na sua regulamentação, não se aproveitou para simplificar procedimentos garantindo a tal flexibilização ou combater o burocratismo inimigo declarado do Presidente da República na sua campanha e nos primeiros dias da sua governação.

Diversos outros instrumentos com impacto elevado foram aprovados nomeadamente, no contexto fiscal, segurança social etc. Que reflexo têm esses instrumentos para nós e para o país.

Como cidadãos não podemos ser indiferentes a estes fenómenos. A cada momento temos que dissecá-los, pensá-los e questioná-los. Ao fazê-lo damos subsídios aos que em nosso nome governam para que ao reflectirem como o fazem em Namaacha, tenham os nossos pontos de vista e saibam o que pensamos, principalmente num contexto em que não temos uma oposição organizada.

Os Japoneses têm uma palavra chamada “dantotsu” que significa lutar para tornar-se o "melhor do melhor", com base num processo de alto aprimoramento que consiste em procurar, encontrar e superar os pontos fortes dos concorrentes.

Moçambique não pode fugir ao seu “dantotsu”; o aprimoramento e reflexão devem ser permanentes acompanhados de uma escolha acertada dos modelos a seguir sem, necessariamente, os copiar mas estudando as formas como, em cada país, a nível legislativo e de políticas, foram superadas dificuldades e alcançado o sucesso. Nesse processo tenderemos para “o melhor do melhor”.

11 comentários:

Jorge Saiete disse...

Isso companheiro, os homens do governo estavam a reflectir e a apnahar ar puro de Namaacha. Nós também gostariamos de reflectir e sobretudo de interagir com os deputados que elegemos para nos representar no edifício da 24 de Julho. Infelismente não é facil interagir com deputados, primeiro porque não sabemos quem são, afinal escolhemos partidos e não pessoas e mesmo tais partidos não divulgaram as suas listas, se o fizeram foi num circuito bem fechado. Os proprios deputados não se mostram interessados em se fazer conhecer, na AR falam pouco e sonecam mais, fora evitam dialogar connosco para juntos reflectirmos sobre este país.
Me parece que seria util repensarmos na forma como os deputados são eleitos e procuramos ter uma eleição directa e não lista pois isso facilitaria a responsabilização áqueles que dormem tanto durante as sessoes e aqueles que se esquecem dos seus circulos eleitorais.

Júlio Mutisse disse...

Jorge meu irmao,

Acho que temos que nos superar a cada momento. Mesmo que tivessemos uma interaccao com os deputados por nos eleitos na AR, acho que nao deviamos nos demitir de nos mantermos atentos, vigilantes e em permanente reflexao sobre o que, em nosso nome, e feito no pais.

Infelizmente Jorge, nao temos cultura de forcar que nos oucam nas nossas preocupacoes. Parece que nos acomodamos muito a ideia de que alguem vai fazer por nos. Quando, como e se a forma como tal vai ser feito e a unica pouco questionamos. Tanto nao questionamos que ao fim de um mandato nem se quer sabemos se algum Deputado dos nossos circulos alguma vez la pos os pes e se os pos o que ia la fazer, pois nem se quer os conhecemos.

Mas estes nossos espacos sao uma forma de despertar esse lado. Quando criticamos e apontamos solucoes como a que sugeres acima de mudar a forma de eleger os nossos deputados, estamos a despertar a nossa cidadania. Estamos a dizer que estamos atentos e que o actual modelo tem deficiencias que precisam ser limadas.

Mas mudariamos a forma de escolher os deputados para qual exactamente?

Anônimo disse...

Pressionar, vigiar e fiscalizar o Poder, e seus representantes, é uma tarefa não só legítima como indispensável. É, digamos, uma tentativa de atenuar os danos.
O laissez faire, o cruzar de braços, não conduz a lado nenhum. O Poder (o Poder sem fronteiras) detesta espartilhos
A ausência de vigilância é um primeiro convite à arbitrariedade e ao autoritarismo. As regras do jogo, exercidas numa democracia (ainda que meramente formal) têm de ser observadas por todos os intervenientes, o que exige uma luta permanente e sem tréguas.
O aperfeiçoamento de mecanismos (Partidos, sindicatos, sociedade civil) é um processo longo e precário. A imutabilidade é um conceito pouco científico.
O que a experiência nos diz, é que a “resistência” espontânea, sem organização, voluntarista
desemboca no caos.
O importante será mantermo-nos despertos e atentos, muito atentos.
Enfim, reflexões superficiais de quem defende a participação de todos na construção de sociedades justas

Patricio Langa disse...

Júlio.
Colocas questões pertinentes que se referem a qualidade e a natureza da representação, participação ou não participação política no nosso sistema político. São questões que definem o conteúdo , significado e o exercício da nossa cidadania. A esfera pública, e incluo a blogosfera nisso, seria um espaço para suscitar esse tipo de questões sobre o nosso preblescito. É uma pena que a a própria esfera publica pouco se interessa de maneira responsável destes assuntos.
Abraço

Elísio Macamo disse...

caro júlio, uma dificuldade evidente na postura que legitimamente reclamas reside no facto de muitas vezes não está clara a posição a partir da qual interpelamos o exercício do poder. esta falta de clareza pode comprometer o que de útil temos a dizer. por exemplo, numa perspectiva académica precisaríamos de identificar o que está em questão e trazer isso à atenção de todos os outros que se interessam por esse tipo de discussão. numa perspectiva activista podemos simplesmente estar interessados em propôr outras maneiras de fazer as coisas. esta atitude, infelizmente, tem sido frequente e não ajuda, pois na maior parte das vezes não revela compreensão adequada do problema. há também a necessidade de ver como grupos profissionais directamente afectados por coisas devem reagir ou posicionar-se. enfim, a sociedade é coisa tão diversa que a nossa crítica pode pecar por homogeinizar demasiado. no fundo, contudo, o desafio é de cidadania e aí concordo contigo e com os outros comentários aqui publicados. abraços

JOSÉ disse...

Se perguntar não ofende:
Foi um retiro do Governo ou da Frelimo?
Muitos que lá estavam não pertencem ao Governo...
Para quando a separação entre Estado e Partido?

Nelson disse...

Oh José, foi retiro do governo, “alargado” aos demais que felizmente são do partido Frelimo e que feliz e coincidentemente é o partido no poder.
Esse negócio de separação do estado e partido está quanto a mim, bem longe de acontecer. É um “casamento” com muitos benefícios para o partido no poder por isso em momento nenhum se interessaria em haver uma separação clara.

Júlio Mutisse disse...

Ora viva companheiros,

Começo por me desculpar pela ausência da blogosfera, estava fora de Maputo em serviço pela províncias de Nampula e Niassa.

Se em Nampula, foi possível aceder a NET, em Lichinga, entre chuva e cortes de energia foi difícil chegar ao IT Café para trabalhar ou espretitar o blog.

Agry,
Todas as reflexões tem algo de útil para a construção de uma sociedade justa. Só pode reflectir, mesmo que superficialmente, quem estiver, como dizes, desperto e atento, muito atento. Me parece que estás.


Patrício,
temos a oportunidade de, usando estas vias, interpelar, questionar e sugerir. Não nos podemos demitir disso se quisermos ser cidadãos conscientes. Isso passa por uma maior responsabilização e, quiçá, por tornar estes espaços mais acessíveis a outros (em todos os sentidos).

Elísio,

Eu penso que a questão fundamental é a falta de mecanismos reais e efectivos de comunicação entre governantes e governados para além da simples difusão de informações preparadas para o consumo público. Faltam ou escasseiam canais efectivos de ligação entre uns e outros.

Estes canais não se criam por Decreto, resultam de processos históricos que ajudam a criar e manter mecanismos efectivos de responsabilidade. Estes mecanismos para mim consistiriam numa estruturação da sociedade (a dita sociedade civil) numa diversidade de sistemas associativos autónomos e dinámicos que estabeleçam relações reais e efectivas de contacto e negociação entre si e com o Governo.

Entrariam aqui, associações empresariais, associações profissionais, sindicatos, partidos políticos (sérios e responsáveis), associações locais a nível dos bairros, como clubes etc.

Se estes mecanismos forem criados e efectivados, a comunicação vai fluir e nisso ganharemos todos. É que, um Governo que efectivamente responde perante o parlamento e perante sectores devidamente estruturados da sociedade, obriga-se a estar devidamente preparado para atender às pressões que possam sair ou daí possam advir e, ao mesmo tempo, cria em nós enquanto cidadãos e membros de algo organizado, a exigência de nos organizarmos cada vez mais e a estarmos informados com responsabilidade de modo a dialogar com o Governo. Sublinho DIALOGAR e não fazer exigências como, me parece, é a tendência das ditas organizações existentes de momento.

José,

Foi um retiro do Governo, alargado aos Governadores Provinciais e outros quadros, para fazer uma reflexão sobre a implementação do plano quinquenal do Governo. Quem eram estes outros quadros? De certeza muitos eram da FRELIMO, não nos esqueçamos que este é o partido com responsabilidade na implementação do tal plano quinquenal.

Mais, será que não estiveram outros quadros para além dos que conhecemos como membros séniores da FRELIMO? Não sei, mas acredito que estivessem.

Nelson,

Pela Constituição, O Conselho de Ministros é composto pelo Presidente da República que a ele
preside, pelo Primeiro-Ministro e pelos Ministros. Aquela reunião era do Conselho de Ministros alargada aos Governadores provinciais (que não são membros do Conselho de Ministros) e outros quadros.

Note o que disse acima para o José.

Não será difícil para si Nelson separar as águas e perceber a essência daquela reunião.

Júlio Mutisse disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
Nelson disse...

"Não será difícil para si Nelson separar as águas e perceber a essência daquela reunião".

Posso ate entender a essencia da reuniao, minha dificuldade em separar as aguas, surge quando se misturam os papeis.

Júlio Mutisse disse...

Não tenho mandato para defender o Governo nem o Partido FRELIMO nem nesta questão nem em qualquer outra mas o essencial que me ficou daquele encontro foi que:

- era uma reunião do Conselho de Ministros que tem como membros o PR, o Primeiro Ministro e os Ministros (note que os Vice-ministros nos termos da Constituição os Podem ser convocados para participar em reuniões do Conselho de Ministros
os Vice-Ministros e os Secretários de Estado).

Nesta perspectiva não me custa afirmar que os outros quadros incluiam os Vice-ministros que os podemos enquadrar na categoria de membros da FRELIMO, outros actores julgados fundamentais para a materialização do famoso plano quinquenal.

Eu não sei quantas pessoas, no todo, estiveram reunidas em Namaacha; também não sei se todas que lá estiveram são membros da Frelimo; não sei também lá estiveram figuras independentes de reconhecido mérito (isso será sempre subjectivo claro) mas, não me custa perceber que eventualmente, houvesse muita gente da FRELIMO que é o partido que suporta o Governo e com interesse directo em que o Plano Quinquenal seja integralmente cumprido.

Mas o fundamental Nelson, não é quem lá esteve, é o que de lá saiu. Não devemos nos deter nestes pormenores. Temos que questionar as conclusões. O que é que aquela gente toda esteve a pensar e falar durante 2 dias em Namaacha.

Somos convidados a analisar õ balanço positivo feito pelo PR em relação a implementação do Plano Quinquenal do Gov., usando critérios de alguma razoabilidade nesse desiderato.