Não haverão mudanças sem a sua acção
Júlio S. Mutisse
Ideiassubversivas.blogspot.com
“O mundo muda a cada gesto seu”
Valete
Meu caro Jaime Joel Guambe (A.K.A Mitó).
Deixe me começar esta carta à boa maneira moçambicana: me desculpando. É verdade. Temos esse dom da desculpa que é extraordinário. Já reparaste que muitos encontros, espetáculos, reuniões, convívios e outros começam sempre com um pedido de desculpas seja “pelo ligeiro atraso” ou pela falta de algo que deveria estar in place e não está? Se ainda não passaste por uma situação destas és um afortunado e, só por isso, mereces a minha inveja (saudável claro).
A minha desculpa aqui é outra. É a minha falta de jeito para escrever cartas. Principalmente para homens. Antes do advento dos celulares, facebook e outras plataformas digitais ainda escrevi umas tantas cartas, afinal essa era a forma possível de comunicar com pessoas que estivessem distantes ou com aquelas que, por conveniência, devéssemos escrever e não falar. Confesso-te, não eram poucas.
Ainda me lembro das duas últimas cartas que escrevi. Uma foi para o meu pai então mineiro na África do Sul. Se fosse nos tempos de hoje com emails, facebooks e similares ao drama colocado no texto teria anexado uma foto para ilustrar a extrema necessidade que tinha relativamente ao pedido que fazia: uma par de sapatos, sapatilhas e sandálias. És do meu tempo deves saber ou lembrar das dificuldades que tivemos para ter essas coisas em determinada época histórica. O facto de a minha esposa ler regularmente os meus textos impede-me de te dizer para quem foi a outra carta.
Esta carta deve igualmente soar como um protexto. Não para ti meu caro, mas para um amigo comum que sempre escreveu cartas interessantes, abordando questões interessantes e que agora calou. A julgar pelo destinatário da última carta (um General) temo que ele tema algo e se tenha acobardado mas dou lhe o benefício da dúvida. Pode ser que depois desta carta para ti ele volte a escrever.
Mas não é para falar das minhas dificuldades em escrever cartas, nem para protextar contra o Mapengo que te escrevo. Para isso tenho outras soluções.
Escrevo te porque te vejo como um homem de causas. Escuto Valete dizer que o “o mundo muda a cada gesto seu” e acho que devíamos abraçar esta visão. Há muitas coisas que temos discutido em diversos fóruns e, não poucas vezes, estacionamos na inércia do Governo, seja essa inércia justificada por exiguidade orçamental ou por qualquer outra razão, e exploramos muito pouco este lado de fazer as coisas mudarem com a nossa acção.
É verdade meu irmão. Ali onde costumamos ver falta de acção de um ente, público ou mesmo privado, pode estar a oportunidade de empreendermos e fazermos as coisas acontecerem. Pode estar a oportunidade de com pequenos gestos, atalharmos caminho para aquilo que queremos.
Não te vou remeter a toda a música de Valete sobre mudar o mundo com cada gesto seu não só por achar que aquele não é o seu estilo musical, mas por achar que o mais importante está dito na ideia de que “o mundo muda a cada gesto seu.” Aliás, diz mais o Valete: podes ser a mutação a cura e a salvação. Não espere por Deus, pelo Governo ou seja quem for; tome a iniciativa de agir no sentido de fazer as coisas acontecerem. Se, do teu lado fizeres esse pequeno gesto, e eu do meu fizer o meu e os outros nos seguirem, temos a chance de fazer com que as coisas que vemos e nos desagradam mudem para melhor influenciadas pela acção.
“O mundo muda a cada gesto seu.” Pode parecer utópico mas é bem próximo da realidade. São as nossas acções que tem o potencial de alterar as coisas a nossa volta. Uma atitude conformista e/ou um olhar expectante no sentido que outros façam o que gostaríamos para além de atrasar as coisas, faz com que elas, em alguns casos nunca cheguem a acontecer.
Façamos de “o mundo muda a cada gesto seu” um lema. Critiquemos o muito que vai errado desde as covas nas estradas, ao streap tease patético e anedótico que nos dá a assistir a nossa polícia perante a impotência da PGR no caso do comando de Nacala, passando por uma decisão do judicial que devia ser cumprida. Critiquemos o lixo que não é recolhido apesar da taxa que pagamos.
Mas, para além das críticas, arregacemos as mangas para mudar o país com pequenos gestos que, se interiorizados pelos demais, podem fazer com que um dia olhemos para as coisas e digamos o meu gesto ajudou a mudar as coisas.
No caso do lixo, por exemplo, a tarefa de vivermos num ambiente são começa connosco sendo por isso necessário nos apropriarmos dos esquemas montados pelas cidades em que vivemos para a recolha de lixo. Conhecedores desta realidade cabe a cada morador do local gerir os resíduos domesticamente produzidos de modo a que sejam depositados nos locais indicados na data e hora (eventualmente) prevista para a sua recolha. Somos todos parte do problema da gestão de lixo e podemos todos fazer parte da solução e, fazer com que o ambiente mude a cada gesto nosso. É apenas um exemplo.
Já não me lembro de como terminam as cartas. Seja como for esta tem que terminar. O mundo dos meus filhos muda a cada gesto de carinho que os dedixo e eles esperam por mim. Para além disso meu telefone não pára de tocar: há quem apesar de ser segunda-feira pretende me levar para longe da vista da minha esposa. Apelo recusado, eu estou engarrafado. Aliás, garrafa dá muita liberdade e mobilidade. Eu estou ensiringado. Vou para casa me meter na sirringa e curtir esse momento.
Um abraço Mitó, até com gestos como esse o mundo pode mudar. Não achas?
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